Uma abordagem sobre as pautas de Ciência, saúde e meio ambiente

May 6, 2024 в Reportagem de meio ambiente
Mente saudável

O Fórum Pamela Howard para Cobertura de Crises Globais bateu um papo com Meghie Rodrigues, membra do Oxford Climate Journalism Network, que abordou assuntos de maior recorrência na área de ciência, saúde e meio ambiente. 

A cobertura da ciência sem negacionismo

Rodrigues ressaltou os desafios de cobrir ciência com o crescimento do movimento antivacina na pandemia. “Muitos colegas ainda precisam desbancar os resquícios das fake news. As pessoas passaram a questionar a eficácia de vacinas tradicionais como poliomielite. Doenças mundialmente erradicadas estão voltando porque a cobertura vacinal está menor,” afirma.

Ela chama a atenção para os estudos sobre os efeitos a longo prazo da Covid no organismo. Passados quatro anos do início da pandemia, as pesquisas conseguem apresentar respostas mais consistentes sobre os efeitos remanescentes no sistema nervoso, nos órgãos e na memória. “É importante a manutenção dos veículos de nicho porque, em geral, são eles que estão cobrindo essas questões”, pontua.

Incluir nas pautas o viés da crise climática

As doenças favorecidas pelo aumento de temperatura média, as migrações globais de populações e os modelos de transição energética são assuntos que Rodrigues têm visto em evidência na mídia. A jornalista destaca que essas e outras pautas de mudança climática não deveriam ser de nicho, mas um ângulo pelo qual se faz a cobertura. “Por exemplo, é impossível falar de economia e moda sem falar de sustentabilidade", explica Rodrigues. "A moda é uma das indústrias mais poluentes do mundo e a economia brasileira é primária e dependente dos recursos finitos, como minério, e da expansão da fronteira agrícola. Essa bolha que separa assuntos interligados só beneficia o capital”.

Para ela,  jornalismo tem o papel de ampliar o conhecimento e dar ferramentas para que as pessoas façam escolhas conscientes. “A cobertura investigativa tem que cobrar das grandes empresas respostas e revelar os impactos das ações que comprometem os biomas e nossa saúde”. 

Como abordar as energias renováveis

Rodrigues afirma que questões complexas, como as energias renováveis, exigem uma cobertura que assuma as contradições do assunto. A geração de energia renovável traz muitos benefícios e retira a dependência de poluentes, como o petróleo, mas traz impactos socioambientais. “Um parque de energia eólica pode deslocar várias famílias de uma região. Ficamos numa lógica maniqueísta. É bom ponderar o lado bom e ruim das soluções" diz a jornalista. "Nós precisamos confiar no público e deixar de achar que ele é bobo e não entende as contradições”. 

Para ela, a necessidade de atualizar as discussões é constante porque essas complexidades tendem a aumentar com as mudanças climáticas. “É importante analisar o que está sendo discutido na academia para aprofundar na pauta. Sem instigar o público a pensar, o jornalismo não serve como instrumento de mudança”.

O que os carros elétricos podem representar

Apesar de ser mais sustentável, os carros elétricos são problematizados por Rodrigues por utilizarem do mesmo modelo de produção, sem beneficiar as comunidades de onde se extraem as jazidas de lítio para fabricar as baterias. “Temos que ser mais críticos com as novas tecnologias. Essas soluções mudam a lógica de produção e consumo? Isso está no cerne da perda de biodiversidade e mudança climática”.

A jornalista destaca que, apesar do objetivo nobre de construir um carro menos poluente, outros problemas continuam. “O entorno permanece igual. No final das contas, não estamos questionando a necessidade de precisar adquirir um carro porque o transporte público é ruim. Estamos substituindo carros por carros. Não é só a geração de carbono que precisa ser resolvida, mas a mobilidade urbana”.

Diversidade para alcançar a audiência

A conscientização da população sobre os efeitos das mudanças climáticas depende de um jornalismo que faça sentido para a audiência. Rodrigues cita uma pesquisa do Instituto Reuters sobre o afastamento da audiência no Brasil, Índia, Reino Unido e Estados Unidos.

Uma das conclusões do relatório é que a cobertura não reflete as comunidades vulneráveis, retratando uma visão estereotipada que diminui essas regiões, sem ouvir os envolvidos. “O jornalismo é majoritariamente feito pela classe média e branca que não sabe a realidade das periferias. Falta diversidade na mídia hegemônica. É óbvio que a população não vai ligar para essas notícias”.


Foto: Canva