Como cobrir tecnologia: big techs, novos produtos e segurança digital

Apr 18, 2024 в Temas especializados
Tech

Cobrir tecnologia vai além da resenha de produtos e aplicativos. Acompanhar as big techs, as questões de privacidade e segurança digital e ainda buscar boas pautas para informar a audiência fazem parte do trabalho. O Fórum Pamela Howard para cobertura de crises globais convidou Rodrigo Ghedin, colaborador do Núcleo Jornalismo e criador do Manual do Usuário, um blog de tecnologia, para falar sobre o assunto. Confira o vídeo do webinar com Daniel Dieb seguido do resumo da conversa.

 

Expansão da cobertura

Ghedin considera que a evolução tecnológica dos últimos 20 anos teve seu ponto de virada em 2007, com o lançamento do iPhone. “Foi criado um produto revolucionário e a maior indústria de produtos de consumo. O mundo se moldou em torno desse dispositivo”. Por outro lado, o jornalista considera que vivemos um paradoxo. Apesar dos efeitos dessa revolução em nosso cotidiano, o espaço no noticiário foi se perdendo. “Antes, os grandes jornais tinham um caderno de tecnologia e, hoje, salvo engano, só sobrou o caderno do Estadão. Não existe cobertura nos grandes veículos”.

A cobertura de tecnologia, segundo ele, ainda é muito restrita a divulgação de resenhas ou "reviews".  “Existem muitas coisas em comportamento, negócios e cultura digital que permitem explorar uma cobertura criativa que ajude as pessoas além da hora que elas vão comprar um computador ou celular”, afirma.

Não é obrigatório ser um expert no assunto

Para Ghedin, o jornalista que pretende cobrir tecnologia não precisa saber programar ou ter um profundo conhecimento na área. “No dia a dia com as fontes e colegas, você vai ganhando traquejo”. O principal é saber fazer as perguntas necessárias para informar o público. “Exceto que você escreva para uma publicação especializada, o mais importante é abordar a pauta do ponto de vista de quem lê”.

Além disso, ele destaca que é bom não perder de vista que estamos escrevendo para brasileiros e que o foco é nos produtos que chegam no mercado nacional. “Ainda temos muitos sites que se alimentam do que a imprensa dos Estados Unidos cobre”.

Como encontrar pautas

 - Fique atento ao que está rolando. “Muitas vezes, você nem está procurando uma pauta, mas a leitura de um texto leva à associação com outro assunto que estava no fundo da sua cabeça”, pontua.

- Mantenha um diálogo próximo com a audiência para colher sugestões. “Isso não acontece espontaneamente, precisa de um fomento. Esteja nas áreas dos comentários”, afirma.

- Acompanhe veículos especializados que publicam pautas setorizadas e traduza os temas para uma audiência maior.

- As redes sociais podem ser um bom canal para encontrar boas pautas. Newsletters e RSS também. “RSS tem uma vantagem sobre as redes sociais porque não tem um algoritmo de recomendação. Com o RSS você que faz a filtragem”, destaca.

- Os sites da Techmeme e Hacker news  são as sugestões para buscar informações sobre tecnologia.

Assessorias: como (não) relacionar-se

Ghedin afirma que a cobertura de tecnologia especializada é muito restrita, o que aumenta as relações pessoais com as assessorias de imprensa das marcas. O mercado oferece eventos com tudo pago e o acesso antecipado aos produtos para fazer resenhas. O jornalista aconselha evitar essas ofertas que podem interferir no editorial. “Fica mais difícil fazer uma cobertura crítica se a empresa te dá benefícios. Isso acaba virando uma moeda de troca”. 

Segurança digital e a abrangência das plataformas

O poder desmedido das big techs precisa de freios. “As grandes empresas de tecnologia cresceram muito e abusam desse poder. Houve a tentativa com a PL 2630 para regular as plataformas, que não evoluiu por causa do lobby das empresas que seriam afetadas por isso”, afirma. 

Ghedin explica que a maioria das grandes empresas molda a experiência do usuário por condicionar o uso na plataforma. Ele exemplifica. “Ao se cadastrar no X, seus dados e experiências ficam restritos e a plataforma dita como o algoritmo funciona para cada usuário”. As plataformas descentralizadas não determinam a experiência do usuário e são uma opção para quem quer desviar desses serviços. Ele cita a Mastodon e a Bluesky como exemplos dessas redes.

Grandes empresas podem garantir um ambiente seguro, mas não privado. “O Google, por exemplo, é seguro. É raro ter vazamento de dados. Mas, ao mesmo tempo, ele usa parte dos nossos dados para veicular publicidade segmentada", explica Ghedin."O Google não vende os dados brutos, mas vende o conhecimento extraído desses dados para os anunciantes. Não tenho privacidade dos meus dados”. Outro problema apontado é a segurança digital. A publicidade veiculada nem sempre passa por filtros e o usuário pode se deparar com tentativas de golpe.

Ghedin ainda destaca que as empresas vêm investindo pesado em inteligência artificial, mas que tem ressalvas. “Eu tenho sérias dúvidas se é mais espuma do que conteúdo, mas só o tempo dirá. De qualquer maneira, as IAS merecem a nossa atenção. Outras tecnologias já prometeram revolucionar o mundo, mas não se mostraram tão grandes assim”.


Foto: Canva