Por que a expressão 'fake news' é imprecisa (e prejudicial)

Nov 2, 2018 em Combate à desinformação
Fake news

Em 2017, o Collins Dictionary elegeu “fake news” a palavra do ano. Em 2018, o termo está saindo de moda. Jornalistas e especialistas em mídia argumentam que o termo não só tem sido usado de forma tão ampla que perdeu sentido, mas também pode ter efeitos negativos sobre as instituições democráticas e a confiança na mídia.

A ideia de que o termo está fazendo mais mal do que bem não é nova. Em janeiro de 2017, Margaret Sullivan escreveu uma coluna no Washington Post pedindo a “aposentadoria” do termo por sua falta de precisão descrevendo muitos tipos diferentes de falsidades --de erros a conspirações-- e tudo mais.

"Todos esses problemas são reais", escreveu ela. “Discuti-los é importante. Mas colocá-los todos na mesma panela e abusar de um nome ambíguo não nos faz avançar. ”

Nos Estados Unidos, o presidente Donald Trump promoveu o termo como uma forma de demonizar e deslegitimar os meios de comunicação, especialmente os veículos de mídia que o criticaram. Recentemente, depois que uma série de bombas foi enviada para críticos renomados do presidente, Trump tuitou que a ira que levou ao ataque foi resultado da “mídia tradicional a que me refiro como fake news”.

Mas Trump não está sozinho. Políticos em todo o mundo também adotaram o termo como uma maneira de falar contra aqueles com quem eles discordam.

“Fora da América do Norte e da Europa, o trabalho antidemocrático das 'notícias falsas' é mais explícito. Em vários países, 'fake news' foi usado para justificar leis de censura --as forças armadas birmanesas e o presidente das Filipinas usaram-no para rejeitar denúncias que se opunham às suas narrativas preferidas", escreveu Joshua Habgood-Coote no site The Conversation.

No entanto, outros têm usado o termo simplesmente como uma maneira de identificar erros ou equívocos em reportagens legítimas, de acordo com Glen Kessler, que escreve o Fact Checker do Washington Post. Hoje, o ciclo de notícias acontece rapidamente e a internet torna a publicação e o compartilhamento de informações mais rápida do que nunca. Não é de se surpreender que ocorram erros --mas usar o mesmo termo que está sendo usado para minar instituições democráticas como a imprensa livre é enganoso.

"Fake news" também foi usado para descrever o trabalho de trolls russos, adolescentes macedônios que criaram anúncios políticos virais nos Estados Unidos ou simplesmente a CNN. Em essência, o termo perdeu qualquer especificidade ou significado.

Além disso, Emily Van Duyn e Jessica Collier, pesquisadoras da Universidade do Texas em Austin, descobriram que pessoas expostas a tuites que continham a frase “fake news” confiavam menos na mídia em geral, demonstrando os efeitos do uso excessivo e da imprecisão do termo. 

Se formos abandonar o uso de "fake news", o que devemos usar?

Claire Wardle, que lidera a estratégia e pesquisa do First Draft, trabalhou com o escritor e pesquisador Hossein Derakhshan para publicar um relatório que examina a desordem da informação e estabelece uma nova estrutura para conceituá-la. Eles definem três tipos de informação de diferentes graus de falsidade:

  • Informação errada (em inglês, mis-information) é quando informações falsas são compartilhadas, mas sem intenção de causar danos.
  • Desinformação (em inglês, dis-information) é quando informações falsas são compartilhadas, sabendo que causará danos.
  • Informação má (em inglês, mal-information) é quando informações genuínas são compartilhadas para causar danos, muitas vezes trazendo informações privadas para a esfera pública.

Outros jornalistas e profissionais da mídia não adotaram uma abordagem tão clara, mas recomendam outros termos mais específicos para diferenciar as falsidades.

O Facebook, por exemplo, abandonou o termo "fake news" para usar "false news". Outros recomendam dar um passo além da simples substituição do termo antigo por um novo.

“Se quisermos evitar conversas vazias e propaganda legitimadora, devemos simplesmente parar de usar 'fake news'. O que devemos colocar em seu lugar? Eu suspeito que podemos fazer muito com termos comuns como "mentira", "besteira" e "não confiável", escreveu Habgood-Coote.

As palavras que usamos para descrever propaganda, desinformação e dados falsos são importantes. Por esse motivo, a IJNet decidiu não usar mais o termo "fake news" para descrever esse conteúdo.

Para os leitores que estão interessados em aprender mais sobre esse tópico, Wardle criou uma lista de leitura com conteúdo relacionado à história da desinformação, seu papel nas eleições, uso em publicidade, possíveis soluções e muito mais.

Imagem principal sob licença CC no Unsplash via rawpixel. Segunda imagem cortesia do First Draft.