Plataforma de jornalismo de dados vira sistema de registro de eleitores no Maláui

por Mandy de Waal
Oct 30, 2018 em Diversos

Emergindo de um clima de "desconfiança e instabilidade”, cerca de cinco milhões de malauianos votaram nas eleições gerais em maio, marcando a primeira vez que o eleitorado votaria para o governo local, membros do parlamento e um presidente de uma vez.

Outra novidade quando as urnas abriram foi uma iniciativa destinada a levar os eleitores informados, verificados e prontos para votar.

"No passado as pessoas costumavam contar com informações do chefe da aldeia e votar de acordo com o que seu chefe dizia", segundo Steven Perete, que ajudou a estabelecer o site 'GotToVote', em entrevista por telefone. "Mas as pessoas agora estão se tornando mais conscientes dos fatos e podem tomar decisões por si mesmas. Eu acredito que quando as pessoas têm os dados certos na ponta dos dedos, vão chegar a suas próprias decisões com base nos fatos."

Perete concebeu a ideia que evoluiu ao site gottovote.malawivote2014.org. Em parceria com a Comissão Eleitoral do Maláui, o GotToVote! liberou informações do governo para torná-las mais acessíveis para os eleitores do país. A iniciativa recebeu apoio do Código para a África, Hivos Internacional, Open Society Initiative of Southern Africa e um consórcio de organizações cívicas do Maláui.   Perete disse que a experiência de crescer em um vilarejo remoto lhe ajudou a perceber que a democracia dá poder às pessoas, mas que o poder é perigoso, sem o conhecimento necessário para tomar decisões informadas.

"As pessoas no Maláui votam, mas têm problemas mais tarde porque votaram na zona errada, ou se registraram em uma zona que não era a sua", disse Perete, que fez pós-graduação em ciência da computação. Ele explicou o desafio em verificar o eleitor: "Para verificar o cadastramento eleitoral, as pessoas tinham que viajar para o mesmo lugar que se registraram para verificar se estavam no sistema". Este era um esforço demorado e dispendioso para pessoas preocupadas em ganhar a vida.

"Outra questão é que as listas de candidatos estavam disponíveis online, mas em formato PDF", disse ele. Ele observou que a penetração da Internet no Maláui é de apenas cerca de 2 por cento, enquanto a penetração móvel é um pouco menos de 20 por cento.

Em junho de 2013, Parete levou suas primeiras ideias para o Bootcamp de Dados no Maláui. Lá ele conheceu David Lemayian, o tecnólogo proeminente e fundador do Código para a África. O evento, organizado pela African Media Initiative e o Instituto do Banco Mundial, buscava hackers democráticos para fortalecer o jornalismo, educação cívica e o público que eles mutuamente servem.

Quando os dois se encontraram, Lemayian já havia implementado com sucesso o Quênia GotToVote! (2012), e ramificações menores em Gana e na África do Sul. Em 2013, milhares de eleitores utilizaram o Zimbábue GotToVote! na corrida para as eleições daquele país. A versão inicial tinha nascido da experiência com o [Código para o Quênia]http://code4kenya.org/) para tentar revolucionar a maneira que os jornalistas africanos e ativistas cívicos usam dados. O programa foi lançado pela African Media Initiative (AMI) e o Banco Mundial, sob a liderança de Justin Arenstein, bolsista do Knight International Journalism Fellowship do Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, em inglês).

"Parete implantou nosso código de fonte aberta, mas estava muito interessado em trabalhar com a gente para fazer a oferta ainda melhor", disse Lemayian, observando que o projeto ganhou o apoio da Comissão Eleitoral do Maláui (MEC, em inglês). "O fato de que o MEC pôde ter uma ferramenta construída por uma redação e adaptá-la para ajudar a organizar uma eleição para um país inteiro por alguns milhares de dólares é uma demonstração de quão poderosos podem ser os aplicativos orientados por dados no mundo em desenvolvimento", disse Lemayian.

O resultado? Maláui GotToVote! ajudou cerca de 300.000 cidadãos a verificarem sua condição de eleitor antes da eleição. Ao utilizar o sistema, outros 46.000 malauianos descobriram que não tinham se registrados ou havia problemas com seus dados cadastrais. O MEC também deu crédito à iniciativa, durante uma entrevista para a Al Jazeera, em ajudar a tornar o processo de votação mais fácil para o eleitorado rural.

As eleições de 2014 no Maláui não foram perfeitas ou sem incidentes. O desfecho foi contestado, e os resultados das eleições foram atrasados. Mas observadores internacionais consideraram a eleição predominantemente livre e justa (o candidato da oposição Peter Mutharika do Partido Democrático Progressista foi declarado presidente).

No futuro, os milhões de eleitores que participarem nas próximas eleições poderão usar seus telefones celulares para verificar o cadastramento eleitoral e obter dados eleitorais diretamente. "O que tentamos alcançar é ajudar o governo a melhor interagir com o público. Pretendemos também ajudar as pessoas a tomarem decisões baseadas em fatos, e não [sobre] rumores impulsionados por grupos com agendas", disse Parete."As pessoas são racionais o suficiente para tomar a decisão certa para si. Tudo que precisam são dados corretos."

Leitura relacionada:

Ferramenta de dados abertos engaja eleitores nas eleições do Zimbábue na IJNet

"Voter registration verification goes electronic" via The Malawian

Foto de Steven Parete, cortesia de Parete