Nove desafios para o futuro do jornalismo

por Maryanne Reed
Oct 30, 2018 em Jornalismo digital

Com mais e mais pessoas consumindo notícias digitalmente, o futuro do jornalismo nunca foi tão brilhante. Mas os jornalistas do futuro terão que enfrentar uma série de desafios, segundo Raju Narisetti, vice-presidente sênior e vice-chefe de estratégia da nova News Corporation.

Narisetti compartilhou suas previsões sobre o futuro dos meios de comunicação com os alunos da faculdade de jornalismo da Universidade de West Virginia, (onde eu sou reitora) como parte da nossa série sobre o futuro da mídia.

Seguindo o formato "listicle", popularizado pelo BuzzFeed, Narisetti falou sobre as nove razões por que o caminho à frente para o jornalismo vai ser complicado de navegar.

  • O impresso não está desaparecendo

Apesar de enxugamento e cortes nos jornais mais importantes do país, o jornalismo impresso continua a oferecer aos anunciantes a maneira mais eficaz de atingir o público em muitos mercados.

Por exemplo, o Washington Post (onde Narisetti trabalhou como editor-chefe) ainda atrai cerca de 40 por cento do mercado local, fornecendo um fluxo de receita necessário para o jornal.

"Se é 50, 60, 70 por cento da nossa receita e há lucro vindo do impresso, sempre teremos que ter uma equipe meio grande com foco no impresso", disse Narisetti. Comparando jornalismo impresso com a indústria automobilística em declínio, ele disse: "É como Detroit. Menos pessoas vão fazer isso [jornalismo ], mas você sempre vai precisar de alguém fazendo isso."

  • Publicidade digital não é o salvador

Embora mais leitores estejam mudando para o digital, as receitas digitais não mantiveram o ritmo -- porque o público tem se tornado cada vez mais fragmentado, dando aos anunciantes a vantagem.

"Se você é um anunciante, as escolhas que você tem, onde pode rodar seus anúncios continuam a explodir", disse Narisetti. "E, como resultado, você [a mídia de notícias] pode fazer uma quantidade razoável de dinheiro com o digital, mas isso não chega nem perto da receita com o impresso."

Narisetti disse que é essencial que as redações construam novos modelos de receita em novos produtos e aplicativos digitais. Ele descreveu o projeto Snowfall (Nevada) do New York Times, ganhador do Prêmio Pulitzer, como uma experiência "incrível" que ficou aquém porque não tinha um modelo de receita ligado a ele. "No final do dia, as visualizações de página do 'Snowfall' são mesmo calorias vazias, porque realmente não geraram qualquer receita incremental."

  • Paywalls estão aqui para ficar e batalhar

Estudantes de jornalismo da Universidade de West Virginia tomam notas e tuitam durante a apresentação de Narisetti.

O número de jornais com paywalls vai continuar a crescer, mas com vários graus de sucesso , porque é difícil atrair assinantes digitais dispostos a pagar por conteúdo. Narisetti diz que o máximo que uma organização de notícias pode esperar atrair a partir de um acesso pago ou um modelo de uso medido é cerca de 5 por cento de sua audiência digital única.

"Se é visto como uma fonte extra de receita, eu acho que vai ter sucesso, mas se paywalls são vistos como a solução do problema [do financiamento do jornalismo], então a maioria deles irá falhar", disse Narisetti.

  • As notícias vão ter que ir aos leitores; eles não têm que vir até nós

Com o Facebook e outras redes sociais proporcionando novos caminhos para o jornalismo, o público moderno não espera trabalhar duro para "encontrar" a notícia. Jornalistas digitais de hoje devem ser capazes de escrever, apresentar e comercializar suas histórias. No mínimo, os jornalistas precisam saber como usar SEO em seu benefício.

"No mundo impresso, há uma posição [responsável pela circulação]... cujo trabalho é descobrir como ganhar dinheiro. Isso não existe no mundo digital", disse Narisetti. "Em 2013, a definição de um jornalista deve incluir 'Eu vou fazer tudo que posso para trazer mais pessoas ao meu jornalismo.'"

  • O vídeo na Web oferece uma saída possível

O vídeo na Web oferece uma oportunidade de rentabilização significativa porque (1) o público quer e (2) a publicidade 'pre-roll' pode ser incorporada ao conteúdo.

"O vídeo é a primeira forma de jornalismo em que descobrimos que quando alguém vê --não importa onde veem-- o modelo de negócios viaja com ele", disse Narisetti .

Por isso, o Wall Street Journal --antes uma publicação apenas impressa-- está agora produzindo cerca de 1.600 vídeos ou 120 horas de vídeo por mês, tornando-se maior produtor de vídeo no mundo, sem contar as redações de TV.

  • Os dispositivos móveis podem ser uma ameaça ou uma oportunidade, mas são uma realidade no jornalismo

Com um número crescente de pessoas que acessam notícias através de dispositivos móveis, organizações de notícias devem adotar um modelo de "mobile -first" [desenvolvido primeiramente aos dispositivos móveis] ou correrem risco de se tornarem irrelevantes.

Isso significa que criar conteúdo que seja fácil de digerir em uma "tela" pequena. "Por exemplo, o lide longo de narrativa de imprensa pode ser substituído por lides mais curtos e espertos que podem ser lidos na primeira tela.

Significa, também, dedicar muito mais recursos para o celular, que ainda vai demorar muito. Narisetti disse que mesmo no Wall Street Journal --onde 36 por cento do seu público lê apenas no celular- somente um grupo pequeno de pessoas trabalha em sua equipe móvel.

  • O jornalismo excelente importa, mas a sensação que os leitores têm ao consumir o jornalismo importa ainda mais

Consumidores de notícias de hoje são "promíscuos" - indo de fonte para fonte e de dispositivo para outro, dando às organizações de notícias uma quantidade limitada de tempo para segurar sua atenção.

"A vantagem que tivemos com as exclusivas do grande jornalismo ou grandes histórias significava um dia quando predominava o mundo da impressão", disse Narisetti. "Em seguida, este tempo foi reduzido a algumas horas, quando os sites tinham que correr atrás [dos furos]. Se você tiver sorte agora foi reduzido para dois minutos."

Narisetti disse que o conteúdo surpreendente" já não é suficiente. A única maneira de recuperar e manter uma audiência é criar experiências atraentes para que continuem a voltar, como o gráfico do -Wall Street Journal_ que acompanhou a fortuna de Mark Zuckerberg em tempo real quando o Facebook abriu seu capital ao público ou a cobertura interativa do Oscar pelo New York Times no Facebook.

  • Experiências boas e ruins acontecem todas no mesmo cruzamento: conteúdo e tecnologia

Para produzir jornalismo digital de impacto, jornalistas, programadores e designers todos têm que trabalhar juntos para criar conteúdo de qualidade que também irá engajar uma audiência.

Mas trabalhar em equipe pode ser um desafio para os profissionais que nem sempre compreendem e apreciam o que o "outro" está fazendo.

"Quando você entra em redações, você não tem que saber codificação, mas o que tem que saber fazer como jornalista é falar a linguagem dos desenvolvedores", disse Narisetti. "Se você faz a conversa sobre qual é a experiência que estamos tentando dar ao nosso público-alvo, os desenvolvedores compreendem e vão entender o que você está tentando fazer."

  • As redações agora enfrentam um novo concorrente: os nossos anunciantes

Muitas empresas que anunciavam na mídia tradicional estão agora indo diretamente para seus consumidores para promover suas marcas. A ascensão do "conteúdo patrocinado" e da "publicidade nativa" criou uma grande ameaça para as redações.

As empresas também se tornaram produtores de conteúdos qualificados, disputando "o único recurso não renovável que meus leitores têm, que é o seu tempo", disse Narisetti. Por exemplo, a General Electric está tentando posicionar-se como um líder em inovação através de vídeos e campanhas de mídia social como o #6secondsciencefair.

"Nós temos que começar a pensar como é que nos envolvemos com essas marcas, como podemos ajudá-los a fazer isso", disse ele . Se as organizações de notícias não jogam nesse espaço, "não vão ter a oportunidade de fazer qualquer receita significativa no digital."

Em última análise, a chave para a prosperidade e não apenas sobrevivência no ambiente digital em constante evolução é continuar a adaptar-se, experimentar e antecipar o que está por vir.

"O bom de falar sobre o futuro é que é no futuro", disse ele. "Mas o ruim é que não tem uma placa dizendo que está chegando. Você apenas acorda um dia e percebe que chegou, e se você não estiver preparado, é deixado para trás."

Este artigo foi publicado originalmente no PBS MediaShift e traduzido para a IJNet com permissão.

_Maryanne Reed é reitora da faculdade de jornalismo da Universidade de West Virginia._

Imagem de Narisetti sob licença CC no Flickr via hellomediacontact