Inclua a comunidade na construção das pautas

Apr 4, 2023 em Engajamento da comunidade
Peças de quebra-cabeças

E se a comunidade participasse da pré-produção dos assuntos da sua redação? Essa é a proposta que Jennifer Brandel, cofundadora do Hearken (empresa de consultoria que ajuda produtores de mídia a melhorar a relação com a audiência), destacou no terceiro webinar da série “Acelerando Negócios Digitais”, um projeto do ICFJ e da Meta. 

“As notícias eram criadas para ‘alimentar a fera’, ou seja, gerar conteúdo para uma hora de TV, vinte minutos de rádio ou duas páginas nos jornais", explica Brandel. "O objetivo era ser a primeira pessoa ou veículo a dar a notícia”. Nessa corrida, fazia sentido eliminar o público da tomada de decisão para agilizar o processo e ganhar da concorrência. “Hoje, na era da informação, com a multiplicidade de plataformas, ninguém diz que não tem informação suficiente ou que precisa de mais informação. As pessoas precisam de informação relevante”.

Diante dessa nova demanda, Brandel alerta que as redações devem continuar dando as matérias que julgam necessárias, mas o público, antes visto de forma geral e abstrata, também tem que participar do processo, com seus interesses e necessidades individuais atendidos.  “Ao invés de começar dizendo: ‘olha, a gente sabe o que vocês precisam saber’, nós perguntamos: ‘o que vocês gostariam de saber e que poderíamos descobrir com e para vocês?’", explica Brandel. "Nessa relação você sai da posição de pai, que sabe o que é melhor para o público”. Este formato muda a dinâmica de poder, gera mais engajamento e conexão.

Pergunte à audiência o que ela precisa

Brandel afirma que as histórias trazidas pela audiência engajam muito mais porque partem de uma dúvida da comunidade que a redação não conseguiu perceber. “Existe uma mudança de paradigma das salas de redação que se entendem como os peritos e decidem qual informação é importante, para outro modelo que assume não saber de tudo e quer saber do público quais temas cobrir”. Ela sugere alguns caminhos para contar uma história participativa:

 - Estabeleça alguns assuntos que mereçam uma cobertura e que possam contar com a colaboração das pessoas.

-Peça ao público que formule perguntas sobre as dúvidas relacionadas ao tema definido. 

-Peça que eles votem na pergunta mais interessante.

- Dê o crédito para a pessoa que trouxe a pergunta e, se possível, dê voz a ela na matéria.

- Depois da história publicada, peça um feedback. Quais perguntas surgiram a partir desse tema e que merecem uma cobertura?

Menos polarização, mais diálogo

Permitir que o público formule perguntas atrai o engajamento e a curiosidade de quem se interessa em saber mais sobre um assunto, mas não tem uma opinião formada. Brandel esclarece que esse modelo de jornalismo evita um dos grandes desafios das mídias: lidar com a polarização e possibilitar que as pessoas questionem os seus pontos de vista, ampliando a oportunidade de diálogo. “As perguntas não precisam ser baseadas em conflitos, um lado contra o outro, que é o formato clássico da notícia, mas podem ser pela busca de uma informação ou de uma linha de narrativa”.

Além disso, a abordagem ajuda na proteção dos jornalistas em relação aos ataques na cobertura política, por exemplo. “Como a pergunta não foi criada pelo jornalista, o político não vai querer atacar o seu potencial eleitorado”. Essa comunicação também diminui a tensão com a audiência ao dar oportunidade de participação a quem se sentiu incomodado com determinada matéria. Ela exemplifica uma maneira de resolver o conflito: “A gente escreveu isso porque alguém, como você, queria saber uma informação. Você tem alguma pergunta?”

Como começar a ouvir seu público?

Brandel dá algumas dicas:

- Inclua aqueles jornalistas da equipe interessados neste tipo de jornalismo.

- Comece pequeno e focado em certos temas. Não precisa ser um projeto enorme inicialmente.

- De qual forma você está ouvindo as pessoas? Seção de comentários, carta ao editor, campo para fazer perguntas, são algumas das possibilidades.

- Não desanime se no início vierem poucas perguntas, faça seu trabalho.

- Dê um feedback se a cobertura vai acontecer para a pessoa que fez a pergunta.

- Entre em contato com a sua audiência enquanto apura a história para gerar mais perguntas e engajamento.

Engajar com conexões e soluções

Brandel afirma que quanto mais o seu público se sentir incluído e ouvido é mais provável que eles consumam, compartilhem e paguem pelo seu trabalho ou atraiam marcas. Para isso, é necessário observar alguns pontos:

- Use das perguntas para fazer conexões sociais: pergunte a sua audiência sobre experiências pessoais que possam ser compartilhadas no jornal como, por exemplo, o embarque numa aventura ou algo diferenciado da região que moram.

 - Utilize do jornalismo de solução: ao invés de apresentar apenas o conflito, reporte soluções aos problemas apresentados na matéria. Isso evita o distanciamento das notícias. “As notícias sobre soluções são mais prováveis de serem consumidas, porque trazem um sentido de esperança, de algo que pode ser feito”.


Foto: Canva