Cada vez mais o jornalismo latino-americano está prosperando no espaço digital.
Plataformas de jornalismo de investigação online estão unindo forças, bootcamps de jornalismo de dados estão decolando e há novos aceleradores buscando financiar novos projetos inovadores.
"No mundo de hoje, os jornalistas passam mais tempo no mundo virtual do que em pilhas de papel", disse Carlos Eduardo Huertas, diretor da Connectas, uma organização sem fins lucrativos que apoia o jornalismo transnacional.
Ao mesmo tempo, a liberdade de imprensa é frequentemente ameaçada em muitos países da região, e os repórteres muitas vezes não possuem as habilidades que precisam para manter seus arquivos e a si próprios seguros.
Um jornalista investigativo veterano da Colômbia, Huertas está ajudando a canalizar essas tendências para o Investigative Reporting Initiative in the Americas. O projeto, que começou em junho e vai durar quatro anos, está treinando jornalistas em oito países sobre como usar ferramentas e técnicas de investigação de jornalismo, bem como segurança pessoal e digital. (Nota: O projeto é administrado pelo Centro Internacional para Jornalistas, que publica a IJNet.)
O projeto também oferece suporte a uma série de reportagens investigativas. Seus jornalistas já cobriram projetos corruptos de construção no Paraguai; tráfico de drogas no Caribe, Costa Rica e El Salvador; e imigração ilegal para o Panamá.
Huertas conversou com a IJNet sobre por que a informação transfronteiriça é essencial para a América Latina agora e o papel da tecnologia no jornalismo investigativo de hoje.
IJNet: Por que é importante que jornalistas de investigação de diferentes países colaborem entre si?
Huertas: Jornalistas no século 21 são marcados por duas características que a Iniciativa destaca. A primeira é que são profissionais capazes de direcionar o foco aos fatos, de modo a compreender as razões e o impacto hiperlocal, e também tornam possível entender o que está acontecendo em um contexto mais amplo, como a região ou mesmo global. A segunda é a [vontade e capacidade de colaborar].
A América Latina é um excelente ambiente para trabalhar nessas duas frentes. Não só por causa das vantagens óbvias de ter uma linguagem, história e cultura comum, mas porque muitas das coisas que estão mudando a realidade do continente são transfronteiriças, de crime organizado para as principais tendências em investimentos na região. Está na hora de os jornalistas usarem essa perspectiva para abordar estas questões que há anos têm sido negligenciadas nos meios de comunicação.
IJNet: Por que o treinamento em jornalismo investigativo é vital na América Latina agora?
Huertas: Este é um momento vibrante para a democracia na região. Desde a queda dos regimes militares --em alguns casos, apenas algumas décadas atrás-- as pessoas estão se capacitando e participando mais, para que as instituições do Estado se tornem mais fortes e o Estado de direito e bem-estar prevaleça.
Neste caminho para a consolidação, é essencial que os cidadãos tenham acesso a informação independente e confiável que revele as verdades que são de interesse para o bem comum, que os agentes do poder preferiam manter escondido. Este é precisamente o trabalho do jornalismo investigativo. Aperfeiçoar as habilidades dos jornalistas na região e fornecer recursos para a produção de tais histórias estão no centro da Investigative Reporting Initiative nas Américas.
IJNet: Conte-nos sobre algumas das investigações já em curso.
Huertas: Graças à iniciativa, foram publicadas reportagens no Paraguai que revelaram uma onda de irregularidades e corrupção por trás de uma série de instalações de esportes ainda não acabadas. Também revelamos como um punhado de ilhas, legalmente adjudicadas por governos no Caribe, são utilizadas para o transporte de drogas. Na mesma linha, mostramos como empresas de transporte em El Salvador e Costa Rica trabalham com traficantes de drogas para mover seus produtos. E descobrimos como a excursão turística é usada como fachada para um afluxo maciço de imigrantes da Nicarágua no Panamá, que transformou este país num ponto de encontro para uma enorme diaspora.
IJNet : Qual o papel de novos fatores como a tecnologia móvel e dados no jornalismo investigativo na região?
Huertas: São fundamentais. No mundo de hoje, os jornalistas passam mais tempo no mundo virtual do que nas pilhas de papel. Isso significa uma melhoria nas habilidades no uso de tecnologia da informação para uma melhor coleta de notícias para as matérias e encontrar outras fontes que anteriormente eram impossíveis de identificar. O mesmo se aplica à relação entre jornalistas e seus leitores. Nesta área, por exemplo, a interação através de tecnologias móveis melhora o trabalho da mídia. A iniciativa, por exemplo, tem uma estratégia inovadora ao longo desta linha para a próxima eleição geral no Panamá.
IJNet: Quais são as principais ferramentas que esses jornalistas vão usar ou estão usando em suas reportagens?
Huertas: A primeiro é a versão espanhola do Investigative Dashboard. Este é um site desenvolvido pela OCCRP, a organização parceira na Europa Oriental, especializada em rastreamento de dinheiro transnacional. Usa uma combinação de componentes online, como o acesso a mais de 400 bancos de dados de negócios em todo o mundo e várias equipes especializadas em gestão de dados. O Connectas é responsável por este componente na Iniciativa.
A outra é a Safe Collaboration Platform que permite que jornalistas trabalhem online em conjunto sob alto nível de proteção para minimizar o risco de vazamentos de comunicações confidenciais entre jornalistas, particularmente para reportagens conjuntas e transnacionais.
IJNet: Conte-nos mais sobre o próximo trabalho da Iniciativa no Panamá.
Huertas: É claro que os períodos eleitorais são definitivos na relação entre a mídia e o público. As pessoas precisam de informação de qualidade para a tomada de decisões que afetam seu futuro. Para as eleições de 4 de maio no Panamá, a iniciativa reuniu os grandes meios de comunicação no país em aliança com organizações para o jornalismo, para trabalhar com ferramentas da era digital. Por exemplo, os membros do público vão enviar relatórios sobre incidentes através de dispositivos móveis para os jornalistas investigarem e reportarem. Teremos uma página na Web onde o público poderá ver as relações de poder dos candidatos. [A página irá usar a plataforma de conexão de mapeamento Poderopedia]. E vamos trabalhar com um especialista para diferentes reportagens, como parte de se concentrar no treinamento das equipes de reportagem e na gestão da informação.
Margaret Looney, assistente editorial da IJNet, escreve sobre as últimas tendências de mídia, ferramentas de reportagem e recursos de jornalismo.