Enviado especial da OMS conta lições da epidemia de ebola

Mar 25, 2020 em Reportagem sobre COVID-19
Covid-19

No webinário inaugural realizado pelo Fórum Global de Reportagem sobre Crise de Saúde do ICFJ, conversamos sobre COVID-19 com Dr. Samba Sow, um dos seis enviados especiais da Organização Mundial da Saúde. O Dr. Sow é diretor geral do renomado Centro para Desenvolvimento de Vacina em Mali. A conversa online foi moderada por Joyce Barnathan, presidente do Centro Internacional para Jornalistas.

Este artigo é parte de nossa cobertura online de reportagem sobre COVID-19. Para ver mais recursos, clique aqui.

O Dr. Samba Sow, enviado especial da OMS que ajudou a conter a propagação do ebola na África Ocidental, diz que a chave para combater o novo coronavírus é a comunicação com líderes locais influentes, bem como soluções adaptadas especificamente a países e comunidades.

"Trata-se sobretudo de educação, informação, sensibilização", disse Dr. Sow, que enfatizou que os jornalistas desempenham um papel crítico para garantir que boas informações cheguem às pessoas certas. "Somos médicos. Eu posso tratar alguém, mas não entendemos de comunicação. Precisamos de todos vocês.”

 

Aqui estão alguns destaques da discussão:

Sobre a diferença entre o surto de ebola e COVID-19:

  • “[COVID-19] é muito maior; a cobertura geográfica é maior. Começou nos países ocidentais com populações muito mais ricas ... enquanto o ebola começou em áreas remotas de difícil acesso rural na África. O número de casos está aumentando mais rapidamente.”
  • “Ebola mata muito rapidamente. É uma doença muito mais severa por causa do sangramento. Como médico ou ser humano, quando você vê um caso de ebola, você nunca esquece... este [COVID-19] é grave, mas o ebola era muito poderoso, muito perigoso e muito severo."   

[Leia mais: Dicas de proteção para jornalistas durante a cobertura sobre COVID-19]

Sobre deficiências nos sistemas de saúde para lidar com COVID-19:

  • “[COVID-19] mostra que os sistemas de saúde, mesmo em lugares como Europa, Ásia e EUA, são muito, muito limitados. Os sistemas de saúde na África são fracos. Não há muitos países africanos com laboratórios adequados ou pessoal treinado para detectar e diagnosticar o problema.”

Sobre o baixo número de casos de COVID-19 na África: 

  • “Existem países onde os casos confirmados estão subindo e lugares onde eles não estão subindo. Não sabemos o que está acontecendo nesses lugares. Talvez zero caso não signifique zero caso.”

Por que fechar fronteiras para impedir a propagação da doença na África não funcionará:

  • “Se os Estados Unidos querem fechar fronteiras, nem mesmo uma mosca pode entrar. Mas na África... realmente não há fronteira entre alguns países. Existem milhares de quilômetros por terra ou rios que não dá para fechar. As pessoas encontrarão outra maneira de entrar... Existem aldeias onde metade está em um país e a outra em outro país. Como fechar isso?”

[Leia mais: Crises de saúde passadas podem fornecer informações sobre COVID-19]

Sobre a necessidade vital de alcançar líderes locais influentes na África:

  • “Se você trouxer um professor ou funcionário da OMS, e um curandeiro tradicional o contradizer, as pessoas ouvirão o curandeiro tradicional... Você deve ter como alvo pessoas-chave em uma comunidade. Fale com elas e mostre a verdade. E as faça acreditar que fazem parte disso. Segundo, você precisa identificar a origem desses rumores falsos. Tenha eles em mira e converse especialmente com os líderes locais.”

Por que o distanciamento social pode não funcionar em qualquer lugar:

  • “Quando você faz [políticas de distanciamento social] tão rigorosas, as pessoas tentam encontrar seus próprios caminhos... É difícil manter as pessoas trancadas por semanas... Se você pode flexibilizar as coisas e adaptá-las às comunidades locais, isso ajuda.”

Sobre a necessidade de tornar os cidadãos "preocupados" com a crise:

  • “Se você quer vencer uma situação, precisa rapidamente estar disposto a fazer com que sua população fique preocupada. Quando uma pessoa começa a se preocupar, levará a sério. Isso aconteceu na Europa. As pessoas não estavam levando isso a sério... Em geral, na África, a população ainda não está preocupada.”

Sobre o que os jornalistas precisam fazer para cobrir COVID-19 com segurança:

  • “Quando você andar pela comunidade, siga as diretrizes do país. Se um jornalista quer ir para um centro de saúde, ficará altamente exposto. Fale com os médicos e faça perguntas... Essa é a sua proteção número um." 
     
  • “Você deve sempre ter água e sabão, lavar as mãos e reduzir o contato direto com as pessoas. E não toque em todos os lugares. Quando você é repórter, pegue seu álcool em gel, água e sabão. Se você estiver conversando com uma população de alto risco, tente cobrir o nariz e a boca.”

Por que a comunicação é uma ferramenta essencial para parar a COVID-19:

  • “A melhor maneira de impedir isso é fazer com que nossas comunidades confiem em nós e envolvê-las para interromper a transmissão da infecção. Isso significa muita informação, sensibilização e comunicação da comunidade. Ter plataformas como esta [Fórum], informando pessoas especializadas em comunicação. Portanto, essas pessoas levarão as principais mensagens ao nível da comunidade. É isso que a OMS está tentando fazer: sensibilizar os líderes dos países, sensibilizar os líderes de comunicação para que possam agir.”

O Fórum Global de Reportagem sobre Crise de Saúde do ICFJ conecta jornalistas que cobrem a nova pandemia de coronavírus com os recursos, colegas jornalistas e principais especialistas em saúde. Saiba mais e participe do Fórum através do grupo no Facebook. Os jornalistas podem usar essas ideias e declarações em suas matérias.

Este artigo foi publicado originalmente no site do ICFJ e reproduzido na IJNet com permissão. 

Imagem sob licença CC no Unsplash via CDC