Entrevista: Jornalismo multiplataforma significa seguir onde leitor vai

por Will True
Oct 30, 2018 em Jornalismo digital

Os dias em que uma organização de notícias poderiam prosperar se dedicando a um único meio acabaram. Com o advento dos smartphones e tablets, agora é cada vez mais importante que as organizações de notícias sejam flexíveis para alcançarem seu público-alvo, publicando conteúdo projetado para ser legível em plataformas diferentes.

Chris Roper, bolsista Knight do ICFJe editor de dados do programa Code for Africa, anteriormente ajudou na transição do jornal Mail & Guardian da África do Sul de um produto destinado ao computador de mesa para um que também funcionava em dispositivos móveis e tablets. Em 2013, a organização venceu o primeiro prêmio Sikuvile para reportagem multiplataforma.

A IJNet conversou com Chris sobre a importância de ter uma presença em múltiplas plataformas e o que organizações de notícias devem esperar durante a transição.

IJNet: O que significa ser uma organização de notícias multiplataforma?

Chris: Provavelmente a coisa mais importante é que significa, como uma organização de notícias, você é forçado a seguir o seu leitor. Assim, os dias de um leitor vir para a plataforma que você escolheu para ele não existem mais.

A outra coisa importante é que lhe dá uma oportunidade para contar histórias de uma forma muito melhor. Você está dando para suas matérias diferentes rostos, diferentes manifestações. Está falando com diferentes públicos, o que significa que pode reescrever a história ao se referir a um público específico. Tem oportunidades para permitir que a história cresça de maneiras que não cresceriam em uma única plataforma. Isso também permite que consiga dinheiro que financie o jornalismo. Quanto mais plataformas você tem, mais público tem, mais fácil é gerar as receitas e ser capaz de começar a anunciar e vender patrocínios para diferentes clientes com base no público que você está alcançando.

O público que está consumindo notícias no celular na África do Sul, por exemplo, será um público muito mais jovem. Portanto, temos um mercado-alvo diferente para a matéria, para a forma como é entendida e para a forma como é vendida.

IJNet: Como você define o jornalismo multiplataforma "bem sucedido"?

Chris: Para mim, a definição de sucesso é conseguir que os leitores e usuários interajam com os seus produtos. E isso está muito no começo, eu acho. Existem, certamente, grandes organizações de notícia com mais dinheiro que têm feito coisas mais bem sucedidas em termos de números. Elas têm mais recursos, mais leitores e o orçamento para fazer marketing. Na África do Sul, o melhor exemplo seria News24, o maior site de notícias na África. Eles realmente fazem um bom jornalismo multiplataforma se medido por números.

IJNet: Esses números são obviamente importantes, pois permitem que o site financie seus esforços jornalísticos.

Chris: A indústria de publicidade sul-africana ainda é muito pouco desenvolvida em termos de digital. Números não são provavelmente tão importantes quanto a forma como está medindo e como muda o que está vendendo. Você não está vendendo visualizações, está vendendo engajamento. Fazer com que os anunciantes entendam isso é o desafio.

IJNet: A ideia "mobile-first" (móvel primeiro) da indústria é um clichê?

Chris: "Mobile first" muitas vezes parece mais como uma oração que uma estratégia. Muitas vezes, as organizações de notícias têm perdido o contato com o público inteiramente. Por isso, eles usam "mobile first" como uma panacéia para voltar a esse público. A organização de notícias que produz notícias que os jovens não querem ler, se vai primeiro ao celular ou não, não faz a diferença. Ainda vai ser uma organização condenada. A plataforma em si não é a bala de prata que as pessoas pensam que é.

Mobile é a plataforma de escolha da maior parte do consumo de conteúdo para um determinado demográfico. Mas é o que vai lhe dar dinheiro? Será que vai permitir que você faça notícias de uma forma significativa? Será que vai permitir mudar a maneira como sua empresa opera? "Mobile em primeiro lugar" é certamente algo a ter em mente, mas a coisa nova é "o leitor em primeiro lugar" -- a plataforma é irrelevante; apenas decida quem é o leitor e siga o leitor em suas diferentes plataformas.

Na África do Sul, a maioria das organizações de notícias vende cerca de 1 por cento do seu inventário móvel porque você tem centenas de milhares de leitores, mas quem quer anunciar para eles? O que você está realmente dando para eles lerem? As pessoas adoram compartilhar fotos de africanos sob árvores, ouriçados com dispositivos de carregamento para celulares, mas isso se encaixa em seu modelo de negócio?

É absolutamente verdade que, se você quiser alcançar a maioria das pessoas na África do Sul, o dispositivo móvel é o caminho a percorrer. Mas essa é uma afirmação sem sentido sem todas as outras advertências.

IJNet: Quais são alguns dos obstáculos que as agências de notícias devem esperar que vão enfrentar ao levar o seu conteúdo para novas plataformas?

Chris: É caro e você não pode simplesmente redirecionar o conteúdo. Precisa criar novos conteúdos para cada plataforma. É um recurso extremamente intensivo. Significa também que muitos jornalistas e técnicos têm que ser empurrados para fora de suas zonas de conforto de forma bastante dramática. Também não há público-alvo para o qual você foi designado para proporcionar isso. Você está criando o público enquanto anda, por isso precisa ter metas muito concretas e realistas para os dois primeiros anos e não esperar o sucesso do dia para a noite.

IJNet: O jornalismo multiplataforma é o futuro dos veículos de comunicação?

Roper: Acho que estamos chegando a um ponto em que jornalismo é jornalismo multiplataforma. Da mesma forma que há dez anos você tinha jornalismo e jornalismo digital, agora você só tem jornalismo, do qual o jornalismo impresso é um subconjunto. [Jornalismo multiplataforma] não vai ser um subconjunto. Eu acho que vai ser muito importante ter múltiplos pontos de contato do seu conteúdo para a mesma pessoa, não apenas para pessoas diferentes em diferentes plataformas.

Imagem principal sob licença CC no Flickr by miniyo73