Entrevista com Marta Monteiro: O papel de ilustrações em notícias internacionais

por Julie Schwietert Collazo
Oct 30, 2018 em Jornalismo básico

A ilustradora portuguesa Marta Monteiro tem um currículo cheio de clientes de prestígio, entre eles, o New York Times, Washington Post e a revista Vogue. Embora ela more em Portugal, Marta é contratada frequentemente para fazer ilustrações acompanhando notícias mundiais, muitas vezes de lugares que ela mesma nunca foi.

Nós conversamos com Marta por e-mail sobre os desafios de ilustrar notícias internacionais e como o meio do desenho pode oferecer aos leitores uma melhor compreensão do que está acontecendo no mundo.

IJNet: Entre seus clientes importantes estão o New York Times e o Washington Post. Como começou a sua relação com cada uma dessas publicações?

Marta Monteiro: Comecei a trabalhar com o New York Times porque um ilustrador português, André da Loba, que trabalha para este jornal há um longo tempo, compartilhou alguns dos meus trabalhos em sua página no Facebook. Matthew Dorfman, que é ilustrador e diretor de arte [página op-ed] do New York Times, viu e recebi um e-mail para o meu primeiro trabalho. Com o Washington Post, eu acho que  consegui a comissão inicial porque ganhei uma medalha de ouro da Society of Illustrators em 2013, mas nunca me perguntei por quê.

IJNet: Como ilustradora, você está sempre enviando propostas e exemplos do seu trabalho a editores? Sempre está entrando em contato com um editor para se apresentar e enviar artigos para consideração?

Marta: Eu enviava desenhos no início [da minha carreira], mas pode levar muito tempo e na maioria das vezes, eu não recebia uma resposta. Descobri que as competições são uma maneira melhor de chamar a atenção dos diretores de arte. Mas, quando tenho tempo, eu olho para revistas ou editoras onde meu trabalho poderia caber bem e envio uma carta, juntamente com amostras de meu trabalho.

IJNet: Quando você está ilustrando uma notícia para esses clientes, o lugar desempenha um papel importante em sua arte. O que faz para aprender sobre um lugar e seu povo, a fim de planejar e concluir uma ilustração?

Marta: Eu costumo ter um dia (8 a 10 horas) e, quando eu tenho sorte, dois dias, para ter ideias e entregar a ilustração. É muito estressante às vezes, porque tenho que ilustrar situações com as quais não estou familiarizada, lugares onde nunca estive ou países que conheço tão pouco. Sempre tenho que contar com o artigo (geralmente um artigo de opinião) e minha experiência limitada para gerar a melhor ideia possível.

Por exemplo, neste último trabalho sobre a relação entre Porto Rico e os Estados Unidos, fui primeiro influenciada pelo que estava descrito no texto [sobre a crise financeira da ilha] e sua semelhança com a crise grega na Europa. Na verdade, teve um ministro alemão que fez uma piada de mau gosto sobre isso, dizendo que não se importaria de trocar a Grécia com os Estados Unidos e receber Porto Rico em troca.

Um elemento visual que é também um elemento narrativo com o qual comecei a trabalhar foi [a ideia de] uma lacuna. Eu senti que havia um enorme fosso entre os dois países, como na Europa, que foi criando uma crise e o aumento da pobreza.

IJNet: Os ilustradores passam por processos de edição? Escritores, por exemplo, são quase sempre editados. Os diretores de arte tendem a aceitar as ilustrações como são enviadas ou frequentemente solicitam alterações?

Marta: Sim, a edição pode acontecer em qualquer ponto ao longo do processo. Às vezes, o cliente ou diretor de arte tem uma ideia que querem que eu transforme em uma ilustração ou me dão algumas regras para começar. Lembro-me de ter que fazer uma ilustração para um artigo sobre o Papa Francisco e não poderia usar seu retrato, então o diretor de arte me aconselhou a usar símbolos. Para mim, esta é também uma forma de edição porque interfere com a forma como eu trabalho. Ilustração não se tratamente somente de ser capaz de desenhar; você também precisa interpretar textos e comunicar-se usando imagens.

A edição também pode acontecer quando eu envio os esboços, mas é menos provável de acontecer com a ilustração final, porque todos os esforços que eu coloco na comunicação e em fazer os esboços tendem a minimizar qualquer edição do trabalho final.

IJNet: O que uma ilustração pode adicionar a uma notícia que uma fotografia não pode?

Marta: Eu acho que a fotografia é usada quando você precisa retratar uma situação específica ou mostrar uma certa pessoa. Se a intenção é ter uma visão realista ou distintiva do tópico principal, como um acidente violento ou um animal exótico que só existe em um determinado país, a fotografia pode ser muito útil.

Por outro lado, a ilustração tem a capacidade de representar conceitos abstratos ou coisas que são impossíveis de fotografar ou ver. Além disso, pode incorporar mapas, diagramas e símbolos -- estes são os elementos que compõem uma imagem ilustrada muito mais fácil de entender.

IJNet: Existem recursos sobre ilustração e comunicação visual (livros, sites ou podcasts) que podem ser interessantes e úteis para os nossos leitores? E também, existem ferramentas de ilustração que os jornalistas podem usar para ilustrar a notícia eles mesmos?

Marta: The Illustration Age tem uma série de podcasts e algumas aulas que considero ser recursos muito úteis. Tem entrevistas com diretores e ilustradores de arte, e conselhos para quem quer se tornar um ilustrador.

Imagem principal: ilustração cortesia de Marta Monteiro