Conselhos para reportagens sobre violência sexual

Jul 18, 2019 em Temas especializados
Abstrato

Contar a alguém uma história de abuso sexual vivida no passado requer muito tempo e coragem. Contar a um jornalista e expor-se à opinião pública requerem ainda mais.

Com essa ideia como ponto de partida, um grupo de jornalistas de uma pequena redação abordou o problema do abuso sexual na Costa Rica.

O Semanario Universidad, uma mídia independente localizada no coração da maior universidade do país (UCR), revelou em fevereiro passado que o ex-presidente costarriquenho e ganhador do Prêmio Nobel da Paz, Óscar Arias, foi acusado por uma mulher de tê-la violado em 2014.

A reportagem foi divulgada na mídia internacional e tornou o Semanario Universidad um lugar seguro para fazer denúncias desse tipo. Várias mulheres resolveram dar seu testemunho para apoiar a outra que foi exposta à opinião pública em um país predominantemente conservador.

Foi assim que uma cobertura exaustiva começou com revelações no campo da política, cultura, ensino superior e religião. Após essa experiência recente, apresentamos algumas das lições aprendidas e conselhos que oferecemos aos colegas que cobrem casos de violência sexual:

  • Coloque a vítima em primeiro lugar: Em casos de abuso sexual, uma situação de dominação e poder é estabelecida, e muitas vezes uma pessoa com uma posição vantajosa na sociedade se submete a uma situação mais vulnerável. O jornalista deve prestar atenção à vítima e acreditar em sua história. Isso não significa desistir da reportagem básica que inclua um contraste de fontes. No entanto, o eixo de sua cobertura deve girar em torno da pessoa afetada.

  • Crie confiança: Antes de citar uma fonte para uma entrevista, certifique-se de que a vítima confie em você. Se necessário, você pode se encontrar sem câmeras ou gravadores. Tome um café com essa pessoa, apresente-se e explique por que é importante que as vítimas denunciem e como o jornalismo pode ajudá-la em sua busca por justiça. Ouça e não questione a veracidade da história, que é o principal medo da vítima.

  • Dê veracidade ao relato: Na maioria dos casos, é praticamente impossível provar um crime de abuso sexual ou estupro, mas existem fontes que podem dar veracidade à história de uma vítima. Como disse o colega Darío Chinchilla, quando se trata de queixas não julgadas "você não pode reportar sobre a 'verdade dos fatos', mas pode informar sobre a credibilidade da queixa". Bate-papo em redes sociais, e-mails e mensagens de texto não são prova de culpa, mas trabalham em favor da história principal. O jornalista é o advogado da vítima? Não, mas o seu trabalho será semelhante de uma certa maneira. Em cada alegação da vítima, o jornalista deve respaldar o que ela diz. A vítima falou com alguém nos dias ou meses em que estava sendo abusada? Uma amiga do passado testemunhou as mensagens que um padre mandou para a vítima, convidando-a para sua casa? Alguém mais foi abusada por essa pessoa ou teve uma experiência semelhante? Obter fontes independentes que permitam chegar à mesma conclusão dará credibilidade à história da vítima.

  • Não pressione a sua fonte: A vítima pode não querer dar todos os detalhes da sua história, mesmo em alguns casos, não vai querer ser gravada ou fotografada. Não tente convencer uma fonte. Dê espaço e deixe a porta aberta caso ela mude seus critérios. No interesse de "contar a história do ano" versus o conforto da vítima, priorize o segundo.

  • Confira o que as autoridades fizeram: Como acontece nas igrejas, nas universidades e nos escritórios do governo, existem mecanismos internos que recebem esse tipo de reclamação e falham, geralmente em favor do acusado. Fique de olho nos procedimentos de reclamações. Há muitas histórias sobre o uso de instituições e regulamentos administrativos que demonstram interesse dos poderosos em proteger seus empregados e ocultar informações valiosas, em detrimento das vítimas.

  • Abra canais novos: Se o seu tratamento da informação estiver correto, muitas pessoas virão lhe dizer "aconteceu comigo também". Nada motiva mais uma vítima de abuso sexual do que ver outra pessoa dar um passo à frente. E se esse não for o caso, incentive a participação. Promova os formulários do Google para que as pessoas possam fornecer suas informações de contato. Deixe claro que suas informações não serão compartilhadas com terceiros e que um jornalista entrará em contato o mais breve possível.


Imagem de JR Korpa via Unplash

Luis Fernando Cascante é jornalista do Semanario Universidad, uma mídia independente financiada pela Universidade da Costa Rica. Ele cobre questões de justiça, o sistema penitenciário e, durante o ano passado, especializou-se em casos de violência sexual. Ele participou do programa da primavera (2019) do Centro Internacional para Jornalistas e é aluno da Thomson Reuters Foundation.