Como freelancers estão bancando jornalismo independente com Contributoria

por Julie Schwietert Collazo
Oct 30, 2018 em Freelance

Quando Keph Senett, uma jornalista freelance de Toronto, no Canadá, olhou para as histórias que ela queria cobrir em 2014 e 2015, percebeu que havia alguns desafios que podem lhe impedir de cumprir seus objetivos.

Keph tinha um nicho para si cobrindo questões globais de direitos humanos e de futebol, dois temas que muitas vezes se cruzam, e a maior parte das histórias que ela estava seguindo aconteciam fora de seu país de origem. Sem um emprego de jornalista ou uma reportagem encomendada por uma publicação que cobrisse suas despesas, o que implicaria fixadores, tradutores e digitadores, não havia nenhuma maneira de ela se dar ao luxo de fazer uma reportagem sobre o futebol feminino no México e Peru.

Havia também a questão de publicar os artigos. O tipo de reportagem que Keph queria fazer resultaria em artigos de formato longo, e apesar de seu trabalho ter apareceido em meios relevantes, incluindo Al Jazeera America e Sports Illustrated vender artigos longos que ainda não tinham sido escritos e estavam, segundo ela, "fora do ciclo de notícias", era um outro investimento que poderia não valer a pena.

Então, quando Keph aprendeu sobre Contributoria, uma plataforma online que atua tanto como investidor e editor, ela estava disposta a experimentar o site.

Jornalistas podem se inscrever para uma conta gratuita no site e propor uma nova ideia de artigo a cada mês. Eles definim as suas próprias taxas em libras, porque o site é baseado no Reino Unido. Em seguida, o site gera um número correspondente de pontos que devem ser obtidos pelo jornalista, a fim de garantir que Contributoria pague  taxa -- o site foi financiado pelo Google no início e agora é apoiado pelo jornal The Guardian e organizações sem fins lucrativos e não-governamentais parceiras da organização. Quando apoiadores se inscrevem para uma conta gratuita, eles também recebem uma atribuição de pontos que podem colocar em artigos que escolhem para apoiar.

Três reportagens depois, Keph diz: "Eu não teria conseguido financiar esses projetos sem Contributoria." Ao contar principalmente com os pontos de amigos, familiares e colegas, ela pode reportar sobre questões de futebol feminino e LGBT no México, Peru e Rússia.

Os usuários também podem pagar contas premium para receber mais pontos. O número de pontos necessários para financiar um projeto não é fixo de um mês para o outro, por isso é quase impossível para um jornalista saber quantos apoiadores vai precisar. É como crowdfunding, mas sem o público geral fazendo o financiamento e com as metas mudando a cada mês.

O fato de que os apoadores não estão pagando do seu próprio bolso para apoiar um projeto deve tornar mais fácil ver um trabalho ser concretizado, certo?

Não necessariamente, diz Robin Marty, uma jornalista baseada em Nova York que usou Contributoria para financiar dois projetos e que atualmente está trabalhando em um terceiro. Embora só leve dois minutos, no máximo, para um usuário se inscrever para o site e ainda menos tempo para alocar seus pontos para o projeto de sua escolha, o site pode ser confuso e estranho para os visitantes.

"Em vez de construir um sistema de recurso que você pode aproveitar em a cada nova proposta, parece que você está construindo a partir do zero com os seus apoiadores a cada vez que inicia um novo projeto", diz Robin. "Isto é frustrante para eles e pode resultar numa perda de participantes. As pessoas que estão ansiosas para ajudar na primeira vez começam a achar que é entediante com o tempo, especialmente quando os jornalistas oferecem uma nova proposta de cada mês. Começam a olhar como um pedido interminável de apoio", acrescenta.

Keph concorda. "A coisa que eu menos gosto no Contributoria é o incessante implorar por pontos", diz ela. "Quase todos os meses, eu estou em uma posição de atormentar meus amigos e redes para me apoiar. Há confusão nisso (eu não te ajudei no mês passado?) e eu odeio ter que pedir ajuda o tempo todo."

Ela acrescenta que os patrocinadores têm enfrentado problemas técnicos no site, e quando isso acontece, eles acham muto chato voltar e tentar novamente. Finalmente, apoiadores permanecem anônimo aos jornalistas, a menos que mencionem especificamente - no Facebook ou Twitter, por exemplo - que alocaram seus pontos para um projeto. O site em si não torna apoiadores visíveis para jornalistas com projetos, que, Keph diz, faz o ato de ser um torcedor "bastante ingrato".

Eu também tenho usado o site para financiar vários projectos, incluindo reportagens de México e Porto Rico. Como Keph e Robin, acho que Contributoria é vital como uma forma de apoio financeiro, não só para financiar reportagens mas para realmente ganhar uma renda. Eu também gostei de um dos outros benefícios do site - ter alguns artigos publicados em uma inserção no The Guardian, (embora fique pouco clara sobre quem e como o trabalho é escolhido para a referida inserção).

Ao mesmo tempo, concordo que a incapacidade de prever o número de pontos e o "pedido interminável" a que Keph e Robin se referem são obstáculos que se tornam mais difíceis de superar a cada mês. Isto é verdade apesar de terem adicionado parceiros sem fins lucrativos e ONGs - entre eles Nature Conservancy, Unesco, Comitê para a Proteção dos Jornalistas, Fundação Liberdade de Imprensa e com que eu vou estar trabalhando, a PBS Media Shift - o que dá ao site mais crédito.

Mas a interface confusa e outras características que minam a credibilidade - incluindo o fato de que o trabalho de jornalistas profissionais aparece ao lado de autores que usam pseudônimos e escrevem artigos cheios de erros - podem tornar os apoiadores menos inclinados a gastar seu tempo para apoiar projetos mais de uma vez. "Qualquer um pode publicar, desde que consiga ter a sua proposta apoiada", Keph observa.

Pesando os prós e contras, Contributoria vale o tempo de um jornalista? A resposta curta é sim, diz Jen Wilton, uma jornalista freelance baseada em Oaxaca, México, que usa o site há um ano.

"Tem sido um recurso muito valioso", diz Jen, "permitindo-me a cavar mais fundo em minha pesquisa e passar mais tempo no ofício da escrita. Espero usar Contributoria por um longo tempo, contudo eu gostaria de ver uma comunidade mais forte se desenvolver, facilitada por uma melhor funcionalidade do site. É uma abordagem inovadora para o jornalismo que é particularmente útil para aqueles que são novos na redação."

Apesar das suas deficiências e, independentemente de se tratar de uma solução para o longo curso, o site pode ser um recurso muito útil para os jornalistas, especialmente os freelancers que estão reportando fora de seus países de origem e têm custos adicionais. Pode ser especialmente bom para os jornalistas que não pretendem usá-lo mensalmente ou aqueles que propõem projetos com requisitos de reportagem menos onerosos e taxas mais baixas, e é um recurso inexplorado para freelancers que vivem em países que não falam inglês e produzem um trabalho em outras línguas.

A equipe do Contributoria diz que está ciente de muitas das deficiências do site e está trabalhando para corrigi-las, enquanto cresce o site. É o dilema de muitos sites, é claro, mas eu espero que possa ser resolvido para que Contributoria continue a ser um recurso útil e talvez até mesmo se tornar um modelo para serviços semelhantes.

Imagem sob licença CC no Flickr via hernanpc