Como evitar desinformação ao cobrir pessoas trans

por Margarita Martín-Hidalgo Birnbaum
Apr 14, 2023 em Combate à desinformação
Two people walking and one is carrying a trans flag on their back.

Após o tiroteio em uma escola particular em Nashville que tirou a vida de três estudantes e três professores, houve uma escalada de retórica de ódio contra pessoas trans, e alguns jornalistas contribuíram inadvertidamente com isso. Alguns repórteres — ao optarem por citar falas de autoridades mal informadas — também validaram o mito de que pessoas com doenças mentais são mais propensas a serem atiradores em massa.

A seguir estão algumas sugestões para ajudar a orientar suas reportagens e contradizer de forma construtiva desinformação que suas fontes compartilham para cobrir com responsabilidade tiroteios em massa e pessoas trans, grupo historicamente marginalizado que tem sido objeto de estereótipos nocivos que os tornaram alvo de ataques pessoais e legislação hostil. Este artigo da Associated Press espalha comentários inflamados de Donald J. Trump Jr. segundo quem houve um "aumento incrível" em tiroteios em massa praticados por pessoas trans. 

(1) É uma prática comum das autoridades de segurança compartilhar a identidade de gênero de pessoas que cometem crimes, e as autoridades em Nashville disseram que a pessoa de 28 anos que matou três estudantes e três professores no dia 27 de março era trans. Mas a polícia não disse que a identidade de gênero estava conectada às motivações nem disse que sabe com certeza que a pessoa se identificava como trans.

Isso gerou confusão nas redações dos Estados Unidos — incluindo a nossa — e alguns veículos entraram em contato com a Associação de Jornalistas Trans (TJA na sigla em inglês) para obter orientação. Nós conversamos com Kae Petrin, que cofundou o grupo e é jornalista de dados e visual no site de educação Chalkbeat.

"Nosso conselho é informar os fatos", diz Petrin, que se identifica como pessoa não-binária e trans, e usa pronomes neutros. "Foque nas vítimas, foque nas consequências", dentre outras boas práticas para cobrir tiroteios em massa que incluem minimizar a identidade dos atiradores.

Se os repórteres vão falar sobre a identidade de gênero de quem cometeu o ataque, Petrin diz que eles devem explicar que as autoridades compartilharam informações contraditórias e que ninguém confirmou que a pessoa por trás do tiroteio se identificava como trans. Petri também advertiu contra contar com familiares e conhecidos para confirmar a identidade de gênero de uma pessoa porque "nem todas as pessoas trans se assumem para as pessoas em suas vidas."

Embora autoridades tenham dito que a pessoa que cometeu o ataque usava diferentes nomes, Petrin diz que a TJA não tem nenhuma orientação específica sobre qual nome usar para identificá-la porque não está claro por que ela estava usando todos esses nomes. Algumas redações optaram por não usar o primeiro e último nomes compartilhados pelas autoridades até poderem confirmar o nome usado pela pessoa em questão, outras escolheram usar o nome legal registrado no nascimento, o nome usado nas redes sociais ou ambos, diz Petrin. 

Dentre as centenas de matérias sobre o tiroteio publicadas nesta semana, Petrin diz que os textos de Jo Yurcaba, da NBC, se destacam pela exatidão e abordagem cuidadosa para informar sobre a identidade de gênero da pessoa responsável pelo ataque.

Repórteres que desejem entrar em contato com a TJA podem enviar email para contact@transjournalists.org.

Para mais informações sobre como escrever com exatidão sobre pessoas trans, consulte os guias de mídia da Associação de Jornalistas Trans, da Human Rights Campaign Foundation e da NLGJA: Associação de Jornalistas LGBTQ+

(2) A maior parte das pessoas que têm depressão, ansiedade ou outras doenças mentais não matam pessoas. Doenças psiquiátricas severas não estão presentes na maioria dos assassinos e atiradores em massa. Veículos informaram amplamente que John Drake, chefe de polícia de Nashville, disse que Hale estava tratando um "distúrbio emocional". Mas Drake não explicou por que isso era relevante na investigação do tiroteio. Embora ele tenha dito que os pais achavam que Hale "não deveria ter armas", Drake não disse por que eles fizeram essa declaração.  

Em uma postagem no site do Poynter Institute, Kelly McBride, vice-presidente sênior e chefe do Craig Newmark Center for Ethics and Leadership, lembra os repórteres que "especulação sobre a saúde mental pode ser nociva na falta de informações concretas". Jonathan Metzl, professor de psiquiatria na Universidade Vanderbilt, estuda percepções errôneas sobre violência armada e pessoas com doenças mentais. Seu trabalho inclui uma análise de 2015 na qual ele e o coautor do artigo dizem que "poucas evidências na população sustentam a noção de que pessoas diagnosticadas com doenças mentais são mais propensas que qualquer outra a cometer crimes com armas".

(3) Embora haja um debate sobre se tiroteios em massa estão se tornando mais comuns, eles são relativamente raros, principalmente quando comparados a tiroteios "cotidianos" que atraem bem menos atenção da mídia. O USA Today, a Associated Press e o Washington Post estão entre os veículos que monitoram tendências de violência armada, e você pode ler mais sobre esses esforços neste artigo. O Philadelphia Center for Gun Violence Reporting e o Pew Research Center estão entre as instituições que oferecem recursos para jornalistas que cobrem violência armada e as implicações de mortes e ferimentos por armas de fogo como uma questão de saúde pública.

Katherine Reed, diretora de educação e conteúdo da Associação de Jornalistas de Saúde (AHCJ na sigla em inglês), Tara Haelle, líder de estudos médicos da AHCJ e outros jornalistas escreveram sobre violência armada no contexto da saúde pública para o nosso site. Leia os artigos abaixo (em inglês):


Foto por Delia Giandeini via Unsplash.

Este artigo foi originalmente publicado pela Associação de Jornalistas de Saúde (AHCJ), uma organização independente e sem fins lucrativos dedicada a avançar o entendimento da população sobre questões de assistência à saúde, e foi republicado na IJNet com permissão. A missão da AHCJ é melhorar a qualidade, exatidão e visibilidade da cobertura de assistência à saúde.