Como lidar com a rotina estressante do jornalismo 

10 janv 2022 dans Segurança Digital e Física
Mulher relaxando com pepinos nos olhos

Em 2018, a jornalista Izabella Camargo teve um “apagão” ao vivo, apresentando a previsão do tempo em um dos programas jornalísticos da TV Globo. Na ocasião, ela esqueceu a capital do Paraná, justamente o Estado em que nasceu. “O público só notou isso, mas por dentro eu estava colapsando”, explicou a jornalista. Em seguida, ela foi diagnosticada com a Síndrome de Burnout e foi afastada por licença médica. Na volta ao trabalho, acabou sendo demitida

Infelizmente, não se trata de um caso isolado. Segundo pesquisas realizadas pela ISMA-BR (International Stress Management Association no Brasil), 30% dos profissionais brasileiros sofrem de Burnout. A pandemia também parece ter aumentado a incidência, principalmente em profissionais da saúde que lidam diretamente com a Covid-19. Mas outras profissões que sofrem constantemente com pressão na rotina de trabalho, como o jornalismo, também são altamente suscetíveis. 

A OMS incluiu a síndrome na nova Classificação Internacional de Doenças (CID-11), a partir de 1º de janeiro de 2022.  Ela foi oficializada como “estresse crônico de trabalho que não foi administrado com sucesso”. Antes disso a Síndrome de Burnout era considera como um problema na saúde mental e um quadro psiquiátrico. A medida visa dar mais responsabilidade para as empresas no cuidado com os seus funcionários. 

Segundo a psicóloga e pesquisadora Nathália Ruviaro, a síndrome de Burnout possui três principais dimensões: a exaustão emocional, a despersonalização e a realização pessoal reduzida. “As principais características são desgaste, perda de energia, debilitação, esgotamento, fadiga, atitudes negativas, irritabilidade, retraimento, perda de idealismo, diminuição da produtividade ou capacidade, moral baixo e uma incapacidade de lidar com estressores”, diz. 

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Stress com vários sintomas

O “apagão” de Izabella Camargo foi o desencadeamento final de uma rotina de desgaste físico e mental que já acontecia há anos. “Fisicamente, porque eu acordava à meia noite, uma ou duas horas da manhã para trabalhar e mentalmente porque eu fazia dois jornais ao mesmo tempo", explica Camargo. "Foram cerca de quatro anos nessa rotina que me fez desenvolver vários tipos de sintomas. Comecei com dor no estômago, dor de cabeça, problemas na pele, queda de cabelo. E eles foram se agravando com taquicardia, falta de ar, e tudo fui tratando isoladamente até o episódio do apagão”, conta. 

J., que prefere ficar em anonimato, relata também uma rotina de estresse diário quando realizou o sonho de trabalhar em um grande jornal no Rio Grande do Sul. Ele relembra que não conseguia se desligar do trabalho, vivia conectado no grupo de Whatsapp. “Eu não percebia o quanto isso estava sendo ruim e o quanto influenciou no afastamento da minha namorada na época e dos meus amigos, porque eu só queria saber de trabalhar”, diz. J. também sofreu um episódio de “apagão” durante uma coletiva em que participou, para a qual não tinha sido bem pautado pelos chefes. A partir dali, os sintomas se agravaram, culminando na busca por tratamento e no pedido dele de demissão do jornal. 

Novas rotinas fora das redações

Mas o que fazer para lidar ou evitar o burnout? Ruviaro diz que o primeiro ato é ir atrás de ajuda profissional e tentar uma nova rotina. “Buscar atividades que aumentam a sensação de prazer e bem-estar como a realização de atividade física, meditação, momentos com a família e amigos, dormir bem, práticas de relaxamento e autocuidado, envolvimento em um hobby e equilíbrio entre o trabalho e as outras áreas da vida”, avisa. 

Camargo, que atualmente dá palestras sobre burnout e sobre produtividade sustentável, conta que uma nova rotina foi sendo criada aos poucos. “Quando você tem o diagnóstico de burnout, você quer  provar para si e para todos ao redor que você continua muito competente", explica Camargo. "O grande desafio é não fazer as atividades com a velocidade que você sempre fez. Aprendi isso aos poucos, com outras ciladas e muitos altos e baixos”. 

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Agora como profissional autônomo, J. implantou uma  nova rotina de trabalho em que se sente mais saudável. “Talvez nunca vá ser aquele mesmo quando comecei no emprego dos meus sonhos, mas eu estou sendo um novo eu, entendendo minhas limitações, sabendo o que eu posso e não posso fazer, não pegando a mais do que não posso dar conta, e evitando qualquer tipo de esgotamento mental”, conclui o jornalista.

Dicas

- Incluir na rotina alguma atividade física. Para J.,o que ajudou, além do acompanhamento profissional, foi redescobrir  as caminhadas e trilhas que tanto gostava.

- É preciso estar atento aos sinais que o corpo manda. Para Isabella, é preciso se respeitar. “ A minha principal dica é se incluir na própria agenda”. 

- A pandemia agravou a dificuldade de separar o ambiente do trabalho e o de casa. Profissionais relatam melhoras após organizar um local dentro da residência apenas para o trabalho. 

- Modere no uso de aplicativos de mensagem como o Whatsapp. O  ideal é estabelecer um limite de horário e conversar sobre isso com os clientes/colegas. Alguns jornalistas optam por ter um celular apenas para o trabalho e outro para a vida pessoal. 

- O problema também pode ser o empregador. Logo, a empresa também tem responsabilidade no bem-estar dos funcionários. É preciso que a área de Recursos Humanos dê suporte aos profissionais que precisem.


Foto: Canva Imagem