Fontes e ferramentas para cobrir segurança viária

Mar 1, 2022 en Temas especializados
Mapa sobre mortes no transito

Apesar do Brasil estar comprometido em reduzir as mortes e lesões de trânsito em 50%, de acordo com as metas da Segunda Década de Ação pela Segurança do Trânsito  2021-2030 aprovada pela Assembleia Geral da ONU em 2018,  a cobertura jornalística da segurança viária geralmente é fria e pontual. Nos jornais matinais e nas seções de cidades dos sites de notícias, o conteúdo é tratado como corriqueiro e banal, seja até mesmo uma violenta colisão da madrugada que está interrompendo o tráfego ou quando são divulgados os balanços das operações de final de ano das polícias rodoviárias.

Mesmo quando há alguma comoção por conta de tragédias coletivas ou do envolvimento de personalidades em crimes de trânsito, jornalistas iniciam uma reportagem sem saber o básico sobre terminologias, conceitos e estatísticas viárias, ficando à mercê das declarações de especialistas ou dos agentes governamentais. Por isso, apresento aqui um kit básico para que pauteiros, editores e repórteres possam ir à campo suficientemente informados. E dessa maneira produzirem histórias que possam não só ilustrar os problemas mas também apresentar soluções que estejam funcionando.  

O primeiro passo é conhecer a legislação. O Código de Trânsito Brasileiro de 1997  define as regras que devem ser seguidas por gestores de trânsito e condutores, como velocidade máxima e penalizações. Ele foi melhorado pela Lei 13.613 de 2018  que criou o Plano Nacional de Redução de Mortes no Trânsito. Estados e município devem não só perseguir a meta de redução de vítimas, mas também fornecer regularmente estatísticas detalhadas e atualizadas da motorização e sinistros viários para o Renaest – Registro Nacional de Acidentes e Estatísticas de Trânsito.  Como o sistema é recente, por enquanto só 18 das 27 unidades da federação brasileira têm contribuído.

Por isso, o sistema mais confiável e que abrange todo o país é o TabNet, repositório de dados do Sistema Unificado da Saúde - SUS. Nele pode-se pesquisar a quantidade de mortes e lesões atendidas nos hospitais brasileiros por região, cidade, raça, escolaridade, faixa etária, tipo de causa, tipo de veículo e outros filtros. O caminho no site é selecionar o item Epidemiológicas e Morbidade, depois Morbidade Hospitalar do SUS e por fim, Causas Externas.

O Observatório da Bicicleta mantido pela União de Ciclistas do Brasil produziu um tutorial que ensina como obter os números relacionados a ciclistas, mas que pode servir de base para outros modais. Lá, é possível ver que em 2021 houve 666 internações de ciclistas decorrentes de sinistros de trânsito na rede de saúde da capital de São Paulo, gerando despesas de R$ 643 mil reais em serviços hospitalares. Há ainda a informação pontuando que das 6.714 internações de motociclistas em 2021, 39% foram de pessoas negras sendo 2.295 pardas e 326 pretas).

Para se ter uma ideia da dimensão do problema brasileiro em relação ao mundo vale acessar o Morte sobre Rodas, mantido pela OMS. Ele pode ser chocante. Um contador no centro da página inicial indica que a cada 23 segundos uma pessoa morre no trânsito em algum lugar do mundo. Apesar de estar em inglês, ele apresenta indicadores por país e por região do planeta. Os dados foram obtidos a partir do Relatório de Status Global em Segurança Viária de 2018.

As estatísticas, por sua vez, ficam mais embasadas após a leitura do Trânsito, um olhar da Saúde para o tema, documento da Organização Panamericana da Saúde, que aborda de forma didática por que mortes e lesões de trânsito são consideradas uma epidemia, com consequências como altos prejuízos financeiros e sociais.

A Opas e a OMS têm colaborado com o trabalho da imprensa. Como resultado de um programa de formação, foi publicado o Cobertura de segurança no trânsito: um guia para jornalistas que contou com contribuição de repórteres de países de baixa e média rendas. Eles relataram experiências que vão ajudar tanto na expansão do foco da reportagem quanto numa sugestão de pauta junto à chefia. Há ainda o suplemento,  16 ideias para reportagens que induz o jornalista a fazer três perguntas básicas antes de começar uma matéria: “qual o foco da minha história”; “com quem devo falar” e; “o que devo perguntar”.

Neste documento do Google Docs estão listadas outras fontes que lidam diretamente com assuntos relacionados à segurança viária. Ela compõe o conteúdo que produzi para um workshop realizado em 2021 com jornalistas de periferia de São Paulo como resultado da formação obtida no Road Safety Reporting Training of Trainners (ToT), iniciativa integrante do Programa de Reportagem de Segurança Viária do ICFJ. Desde 2015, o programa oferece treinamentos de cobertura de segurança viária para jornalistas de países em desenvolvimento e disponibiliza financiamentos para produção de reportagens ligadas ao tema.


Foto: Captura do website da OMS - Death on the roads