Em parceria com a nossa organização-matriz, o Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, em inglês), a IJNet está conectando jornalistas com especialistas em saúde e líderes de redação por meio de uma série de seminários online sobre COVID-19. A série faz parte do Fórum de Reportagem sobre a Crise Global de Saúde do ICFJ.
Este artigo é parte de nossa cobertura online sobre COVID-19. Para ver mais recursos, clique aqui.
“O último evento que alcançou todo o planeta foi o meteoro. Nem Guerra Mundial, conseguiu ser tão mundial quanto a COVID-19”, conta André Faro, doutor em psicologia e convidado do 13º webinar realizado pelo Fórum de Reportagem sobre a Crise Global de Saúde no dia 10 de setembro.
Professor da Universidade Federal de Sergipe e pós-doutor pela Universidade Johns Hopkins, Faro falou sobre saúde mental, pandemia e estudos que vem desenvolvendo sobre o tema.
Veja a seguir as principais declarações de Faro:
Sobrecarga geral
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A sobrecarga é um dos principais impactos da pandemia que tanta gente tem vivenciado em meio à reorganização radical das próprias vidas.
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Dificilmente há notícias positivas, o que “debilita a capacidade de lidar com a situação e abre a porta para que a gente desenvolva questões em saúde mental”. “A incapacidade de fugir do assunto” mantém as pessoas em espécie de “ruminação coletiva” reverberando o mesmo “estressor comum”.
Medo e preocupação
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O medo e a preocupação são motores do funcionamento humano e a regulação emocional dessas sensações é um indicativo de como está nossa saúde mental. Antes da pandemia faziam parte do dia-a-dia, mas nunca de modo tão intenso e concentrado.
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“Ausência de medo expõe você fisicamente. Excesso de medo expõe você mentalmente."
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Não ter medo, “ainda que possa trazer alguma sensação de tranquilidade, amplia seu risco” e o risco coletivo. O fato de se sentir tranquilo em excesso diante da pandemia não necessariamente é algo protetor, caso você não esteja aderindo aos métodos de prevenção.
Regra do 5 + 1
- São fatores que favorecem o controle do medo. O passo zero é a regulação emocional. É recomendável que a caracterização do que se teme seja baseada em fatos, do contrário o indivíduo fica “possivelmente inflacionando o medo, ou reduzindo em excesso”. Não significa que deixa de ter medo, mas entender melhor aquilo que teme ajuda na busca de soluções mais viáveis.
- Cuide do corpo com atividades física, alimentação adequada, sono. Além de desviar o foco da pandemia, promove o bem-estar.
- Conecte-se, pois quem não conversa não retroalimenta o medo. Compartilhar traz um parâmetro de realidade.
- Procure ajuda quando o sofrimento ultrapassa a capacidade da pessoa. Se o prejuízo diário é muito grande ao ponto de paralisar as atividades, é importante buscar um profissional.
- Faça pausas. A vida em casa está mais desorganizada e corrida que antes, e uma queixa comum é a incapacidade de regular o próprio dia. “A criação de uma nova rotina demanda muito de você e fazer pausas ajuda a reorganizar seu dia.”
- Altruísmo tem sido um fator atenuador do estresse e do sofrimento psicológico ao longo da pandemia. “Porque embora preocupado, você se sente parte, e ao se sentir parte, você tem mais domínio.”
Pessoas que não estão em isolamento
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Algumas pessoas sentem que o isolamento social deve ser equilibrado com um "excesso de liberdade", a fuga. “Na primeira possibilidade que há para ir à rua, dá a impressão que tem que ser aproveitada ao máximo. Você não vai à praia, vai passar o dia na praia."
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As pessoas que precisavam de um motivo para sair de casa podem ser contagiadas pelo movimento de massa. A publicização exagerada dessa abertura pode trazer uma consequência danosa.
Jornalistas que cobrem a pandemia
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Em psicologia, na área de saúde e enfermagem, há especialização em comunicação de más notícias. A forma que você comunica pode piorar a más notícias, ou passar um retrato infiel e atenuando.
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Na cobertura da COVID-19, parte significativa são más notícias. Há ainda exposição exagerada ao assunto e isso afeta quem comunica. O desenvolvimento da habilidade de conseguir comunicar e conseguir pensar de modo mais realista e racional é algo protetivo.
Consequências a longo prazo
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O funcionamento cotidiano está acentuado, “como se o nosso ponto médio de regulação subisse”. É o “novo normal” em termos de ajustamento psicológico. A distância entre o que torna difícil de lidar, como a raiva exagerada e a raiva cotidiana, está mais próxima. Isso a gente vê mais na ansiedade e estresse, do que na depressão.
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O que há em experiências anteriores é de alguns quadros de saúde bem comuns – frente à SARS, ou desastres de grande porte – como o estresse pós-traumático. No caso, estamos observando as pessoas acometidas diretamente pela pandemia, como profissionais de saúde, quem teve COVID ou perdeu pessoas próximas.
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Também existem traumas mais específicos, como o medo de espaços abertos (agorafobia), de espaços fechados (claustrofobia) e de contato (fobia social). Há hoje um panorama favorecedor de aparição por alguns meses ou anos.
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“A COVID não sairá da nossa vida tão cedo, ainda que tenhamos vacina”. A gente passará a conviver com ela e espera-se que esses quadros clínicos demandem uma atenção especial de profissionais da saúde mental.
Como se prevenir em termos de saúde mental?
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Enquanto a gente vai entendendo quais são as pessoas mais vulneráveis, devem ser feitas medidas em termos de políticas públicas e acompanhamento individual para atenuar o impacto futuro.
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A sociedade está entrando num estilo novo de funcionamento e o modo como as pessoas estão lidando vai determinar esse sofrimento mais a frente. No entanto, isso funciona em conjunto com a vulnerabilidade. Pessoas com níveis mais altos de estresse podem desencadear novos transtornos ou ter problemas que não tinham antes.
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No curto prazo, esse aumento de volume não diminui. A longo prazo teremos que aprender a lidar com isso até regular o que estará integrado na história. “Quem ajustar como memória será mais saudável.”
Rodrigo de Assis é jornalista, residente em São Paulo, com formação na Faculdade Cásper Líbero. Pesquisa a cultura viva e escreve poesia. Medium: @rqohen
Imagem sob licença CC no Unsplash por Tonik