O ponto de partida de uma reportagem é, quase sempre, a definição da pauta. Essa escolha nasce da combinação entre observação, vivências e uma boa dose de atenção ao que acontece ao nosso redor.
Quando o pensamento se ativa e a ideia certa surge, tudo parece se encaixar. Você define a linha da matéria, escolhe os entrevistados e levanta as fontes. Pronto: temos uma pauta promissora. Começa então a fase de apuração, que pode ter inúmeras variáveis, que vão das fontes ao tom adotado, passando pelo conteúdo e abordagem, mas deve ter um roteiro claro, conduzido por você.
Até que, de repente, algo muda. Um detalhe, uma nova abordagem ou, simplesmente, um fator externo. Pronto: a pauta cai e a matéria pronta é descartada.
E agora? Veja algumas dicas reunidas aqui:
1. Pró-atividade para mudar o foco
Para Ursula Neves, freelancer da Agência Bori, do Globo Esporte e membro da diretoria da RedeComCiência, a pró-atividade pode ser um diferencial, ou seja, não ficar apegada ao que gostaria, mas o que existe disponível. “A dinâmica do trabalho no “Eu, Atleta”, do Globo Esporte, por exemplo, é diferente porque as pautas ficam disponíveis e você escolhe a que se encaixa melhor para você e pode ser trabalhada”, ela explica.
2. Pré-apuração sempre
Para Neves, uma boa opção, para evitar que a pauta seja rejeitada, é detalhar bastante a descrição, além de fazer uma pré-apuração com as fontes que serão ouvidas. “Assim podemos tentar evitar que alguma fonte seja descartada, explicando sobre o diferencial dela e o porquê da escolha”.
3. Não demore para avisar
Neves também lembra que ao saber que a pauta caiu, durante a apuração em função de alguma intercorrência, é preciso informar o mais rápido possível ao editor. E, de preferência, é de bom tom apresentar uma alternativa, como a substituição de entrevistado, outro foco ou linha a ser seguida.
4. Entenda a linha editorial
O jornalista Renan Moura, do Sistema Globo de Rádio, explica que na redação em que trabalha existe uma grande liberdade de escolha do que será colocado no ar, mas há um detalhe: "É fundamental observar a linha editorial para poder fazer as melhores escolhas. Atualmente publicamos muito o factual e menos matérias detalhadas”, explicou.
E justamente por conta da linha editorial, Moura diz que muitas vezes precisa explicar o porquê de não aceitar algumas sugestões de assessores de imprensa.
5. Sinceridade com respeito
Segundo Moura, é nítido que os conceitos de gestão de pessoas melhoraram muito ao longo dos anos e o constrangimento, principalmente quanto aos novatos, como aconteciam nas redações, vêm mudando. “É importante que se junte sinceridade, educação e respeito. Não trato ninguém de uma forma que não gostaria de ser tratado”, reforçou. “Sou franco e recebo a mesma sinceridade. Faz parte do jogo”.
Thales Martins, editor-chefe de esportes dos jornais O Globo e Extra, tem a mesma filosofia de ser cordial: “Assumi o cargo de editor muito jovem e minha meta sempre foi não cometer os mesmos erros que meus editores tinham cometido comigo”. Ele explica que é pertinente se colocar no lugar dos repórteres quando a pauta deles é derrubada. “Nunca descarto uma pauta por completo. Isso é bem raro. Geralmente peço para que volte na próxima reunião apresentando outro formato”.
6. Evite linha cruzada
Para Martins, outro ponto que deve ser lembrado é o cuidado na abordagem em grupos de Whatsapp, muito usados atualmente. “Encontrar o tom certo é um desafio. É preciso tentar não dar margem a interpretações erradas e, nesse caso, apesar de não gostar de usar áudios, as vezes ele é necessário”.
7. Transforme frustração em aprendizado
Diante do imprevisto, a melhor saída é transformar a frustração em aprendizado. Compartilhar essa experiência, no meu caso, se mostrou o caminho mais produtivo, inclusive para entender como outras pessoas lidam com esse tipo de situação. Mesmo sendo uma rotina constante no jornalismo é importante não fazer disso motivo para desistir.
Ouvir um negativa não pode ser o ponto final da história. O jornalista precisa saber questionar. Martins lembra que, com certeza, existe limites, mas a troca de ideias na redação só tende a contribuir para o desenvolvimento da matéria. “Tenho muita dificuldade em dizer não e espero que o repórter reaja se ele considerar que a opinião dele é mais interessante do que a minha”.
Por que travei e não consegui encontrar uma saída? Na hora que você descobre alguns dos motivos que dificultaram a retomada de uma pauta ou de uma matéria que ficou incompleta, você se liberta e segue em frente com a mesma confiança. Palavra de quem já passou por isso.
Foto: montagem Canva