Para jornalistas, pandemia é oportunidade para reavaliar práticas de trabalho

Автор Fhoutine Marie
Jun 25, 2020 в Reportagem sobre COVID-19
Computador, caderno e câmera em mesa de escritório

Em parceria com a nossa organização-matriz, o Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, em inglês), a IJNet está conectando jornalistas com especialistas em saúde e líderes de redação por meio de uma série de seminários online sobre COVID-19. A série faz parte do Fórum de Reportagem sobre a Crise Global de Saúde do ICFJ.

Este artigo é parte de nossa cobertura online sobre COVID-19. Para ver mais recursos, clique aqui.

A pandemia do COVID-19 teve como efeito colateral profundas transformações no mundo do trabalho, afetando particularmente as rotinas de jornalistas de todo mundo. Este foi o tema do segundo webinar do Fórum de Reportagem sobre a Crise Global de Saúde, realizado em 22 de junho, que teve como convidados Mariano Bartolomeu e Mayra de Lassalette, jornalistas do serviço em português para a África da Voz da América, organização multimídia dos Estados Unidos que oferece conteúdo para públicos com acesso limitado à imprensa. 

“Nós não fomos preparados: em nenhum momento tínhamos uma ideia de que poderíamos fazer nosso trabalho de forma remota. Então eu diria que as semanas foram um pouco caóticas porque tivemos que nos adaptar a uma situação completamente nova”, diz Bartolomeu. Entre as dificuldades, os jornalistas citam a falta de estrutura e equipamentos e a ampliação das jornadas de trabalho, o que exigiu dos profissionais muita criatividade para se reorganizar e manter a produtividade neste período.

Os jornalistas relatam que a prática cotidiana vai apresentando algumas necessidades que podem ser solucionadas pelas empresas - como upgrades de planos telefônicos, fornecimento de equipamentos para adaptar o ambiente doméstico ao trabalho com itens para iluminação e cenário. Em outras situações, eles mesmos buscam ferramentas tecnológicas, como aplicativos de teleprompter, para gravação de off, edição, entre outros. “Eu acho que quanto mais soluções desse gênero tivermos, menos difícil se torna nosso trabalho, mais facilmente reduzimos essa pressão, essa tensão e esse excesso de horas”, diz Lassalette. “No fundo se trata de tentar criar essa sustentabilidade entre nós, o trabalho e as ferramentas que estão disponíveis.”

 

 

Veja a seguir as principais declarações da conversa:

Um novo modo de lidar com a internet

  • Um ponto levantado trata de evitar que a audiência perceba que os profissionais estão submetidos a toda esta pressão, uma vez que nem todos possuem o mesmo acesso a tecnologia ou a mesma destreza em seu uso. “Todos estamos a trabalhar duplicado, as oito horas diárias facilmente se transformam em 16. Dedicamos um esforço extra para garantir que nada disso falhe”, diz Lassalette. 

  • Contudo, ela avalia que mesmo lidando com essa situação sem preparo, o saldo tem sido positivo e que há muito conteúdo sendo produzido no jornalismo sem necessariamente estar descolada da qualidade. “Nós não escolhemos trabalhar remotamente; uma crise fez com que isso acontecesse. Mas há vitórias: estarmos falando sobre isso já é uma vitória.”

Novas rotinas

  • Um desafio frequentemente mencionado pelos profissionais tem sido como separar a vida profissional e pessoal quando a casa se torna o local de trabalho. Nesse sentido, a recomendação é  o estabelecimento de rotinas bem definidas. “Quando eu acordo, eu faço uma rotina como se estivesse indo pro escritório. Isso me permite entrar num estado de espírito, um estado de ânimo, digamos assim, para estar concentrado”, diz Bartolomeu. 

  • Listar prioridades também pode ser muito útil nesse processo, conforme descreve Lassalette. “Uma coisa que eu faço sempre para garantir que não perca o foco é apontar tudo o que tem prioridade. Logo de manhã escrever as primeiras cinco ou seis coisas que precisam ser feitas hoje." 

  • Outra dica é delimitar a jornada de trabalho, mesmo considerando a ampliação das tarefas durante a pandemia, ter horário para iniciar e terminar as atividades do dia é uma forma de gerenciar melhor o tempo e manter a sanidade mental. “Nosso horário é das 7 às 15h. Eu só vejo notícias até as 12h, porque eu sei que se algo muito grave acontecer alguém irá me ligar. Ficar ligado na televisão e na internet cria estados de ansiedade e não nos permite pensar.” 

Jornalismo pós-COVID-19

  • “É evidente que agora que se descobriu que tanta coisa se pode fazer remotamente acho que algumas coisas irão mudar”, diz Bartolomeu sobre as possibilidades de mudança no jornalismo após a pandemia. “No caso dos produtores nunca se teve ideia de que fosse possível realizar remotamente, mas as dificuldade puxam pela imaginação e pudemos a partir de casa manipular certos conteúdos e colocar no sistema. Daí pra frente vai depender de cada serviço se adequar, mas é impossível saber a esta altura.”

  • Apesar das incertezas, o momento atual é visto como oportuno para estarmos preparados para o futuro. Na avaliação de Lassalette, “esta é uma boa oportunidade para que se criem as condições para que se não sejamos outra vez apanhados de surpresa… Acredito que há muito trabalho que não pode ser feito a partir de casa com tanta eficiência se nos mantivermos só em casa, mas há aqui uma grande oportunidade para avaliar e rever tudo.”


Imagem sob licença CC no Unsplash via Galymzhan Abdugalimov