4 livros em português que todo enviado especial precisa ler antes de viajar

Автор Evandro Almeida Jr
Oct 30, 2018 в Jornalismo básico

Seja qual for o período da carreira do jornalista, ser escalado para uma cobertura no exterior é um grande desafio. Normalmente são selecionados jornalistas mais experientes na redação. Contudo, alguns novatos recebem a missão para trazer outra perspectiva do assunto.

Ao redor do mundo, as histórias de jornalistas em inglês ainda prevalecem --como as de John Reed, George Orwell e John Hershey--, mas há relatos em língua portuguesa que merecem nossa atenção.

Abaixo, selecionei quatro livros escritos em português e perguntei aos autores sobre as dificuldades, aprendizados e pontos positivos na cobertura internacional. 

Kosovo: A Guerra dos Covardes (Editora: DBA; 224 páginas)

No final dos anos 90, o jornalista Kennedy Alencar foi um dos primeiros jornalistas brasileiros a viajar para a Sérvia para cobrir a guerra de independência da província do Kosovo. Na época, Alencar trabalhava para a Folha de S. Paulo e visitou os territórios em duas ocasiões.

Em seu livro, Alencar mostra como a sociedade sérvia e kosovar enxergavam o conflito e os bombardeios da Otan afetando ambas as partes.

Em mensagem por e-mail, o jornalista conta que foi para a Sérvia “na cara e na coragem, devido ao interesse em fazer uma cobertura de guerra e muito influenciado por uma visão romântica, ancorado nos livros do Ernest Heminguay”.

Ele destaca duas lições que aprendeu e levou para todas as coberturas posteriores: planejamento e equilíbrio.

“O planejamento teria me ajudado a fazer um trabalho melhor. Desde então, aplico isso com mais zelo,” diz Alencar. “Sempre faço um roteiro das entrevistas com cuidado e estudo mais os assuntos que vou abordar. Checo com mais atenção se tenho tudo o que preciso para improvisar menos.”

A segunda lição, equilbrio, teve impacto tanto na profissão como na vida do jornalista: “Quando fui para o Kosovo, achava que tinha muitos problemas na vida. Descobri que 90% simplesmente não existiam ou não eram importantes. E que os outros 10% eram bem administráveis, digamos assim,” explica.

Por testemunhar os extremos da natureza humana, Alencar diz que aprendeu a agir com mais equilíbrio para superar adversidades.

Índia: da Miséria a Potência (Editora: Planeta do Brasil; 150 páginas)

Escrito em 2008 pela jornalista da Folha de S. Paulo Patrícia Campos Mello, o livro traça um perfil da nova Índia e examina as ações do governo desde Gandhi e do setor privado para atrair inovação e investimento.

Durante duas visitas ao país, a jornalista falou com cidadãos comuns e até bilionários do setor tecnológico, mostrando soluções e não apenas dificuldades. Com isso, oferece um contexto humano do segundo país mais populoso do mundo — com mais de um bilhão de moradores.

O mais interessante do livro para mim é como Campos Mello descreve a sociedade indiana: o trânsito, os problemas de infraestrutura e a pobreza.  

“A Índia é um país fascinante. Mesmo que viajasse umas 18 vezes não conseguiria entender. O maior aprendizado foi saber lidar com o fascínio daquele lugar”, diz Campos Mello.

Guerras e Tormentas: Diário de um Correspondente Internacional (Editora: BesouroBox; 320 páginas)

O repórter multimídia gaúcho Rodrigo Lopes narra em 15 capítulos suas mais importantes missões como enviado especial pela Rádio Gaúcha e o jornal Zero Hora.

Lopes se especializou em coberturas de crises. Esteve em New Orleans, Haiti, Líbano e Peru em momentos críticos.

Ele explica que busca muito o lado humano em sua cobertura porque são as pessoas, em última análise, as vítimas das decisões tomadas pelos líderes políticos e militares.

“Em situações de guerra ou crise humanitária, o jornalista tem sempre mais privilégios do que a população civil — em geral, pode entrar e sair daquela zona quando quiser; tem condições logísticas, financeiras e razoável segurança para evacuação caso necessário. A população não tem”, explica Lopes por e-mail.

“Confesso que, em vários momentos ao longo de coberturas, me sinto um pouco impotente porque, de fato, vamos até lá, tiramos muitas fotos, entrevistamos, as pessoas abre suas portas e suas vidas a nós, jornalistas, e, na prática, nada muda para elas. Mas fazer o quê? Este é o nosso dilema como profissional,” ele afirma, explicando que seu papel é chamar a atenção às violações aos direitos humanos.

Correspondente Internacional (Editora: Contexto; 187 páginas)

O veterano jornalista e pesquisador Carlos Eduardo Lins da Silva conta sua experiência como correspondente em três ocasiões nos Estados Unidos e compartilha as dificuldades de transmitir assuntos do exterior para o público brasileiro.

Lins da Silva não se atém apenas à própria experiência, trazendo histórias e perfis de enviados especiais e correspondentes de todo o mundo. O livro dá dicas desde sobre como se portar em um outro país a analisar os dados pensando em seu leitor.

O jornalista enfatiza que o enviado especial deve “estar atento ao que o seu público, em casa, julgaria mais relevante saber sobre o assunto da cobertura”.

Ele também acrescenta que ser enviado especial traz benefícios para a carreira do jornalista que vão além de enriquecer o currículo: abrir a cabeça para novas experiências e pontos de vista.

Evandro Almeida Jr é estudante do último ano de jornalismo na FIAM FAAM Centro Universitário e criador do site multimídia Humanitária.