Em 2018, algumas cidades da Nicarágua tornaram-se zonas de conflito armado e, sem querer, os jornalistas tornaram-se correspondentes de guerra.
Nossas fontes e contatos em vários lugares disseram coisas que nunca esperávamos ouvir deles: "Fique aqui atrás dessa barricada, vou garantir que não haja paramilitares lá". "Ontem naquela antena de comunicação tinha um atirador. Deixa eu ver se ele está lá hoje."
No final de junho, eu estava em León, a segunda maior cidade do país, quando suas ruas históricas foram cercadas por barricadas de paralelepípedos em cada quarteirão. Estava reportando com um colega do La Prensa, um fotógrafo, e estávamos em uma encruzilhada de quatro barricadas que protegiam os vizinhos de ataques paramilitares relacionados ao governo.
De repente, os poucos transeuntes começaram a correr e se abrigar em suas casas. Uma mulher com um bebê nos braços gritou para nós: "Você, com a câmera! Há um alerta laranja! Viram alguns homens em motocicletas vindo com AK47!"
Graças ao nosso contato local (um estudante universitário em León) conseguimos encontrar uma casa segura para nos proteger do perigo de ataque.
Nunca pensamos que estaríamos nessa situação e, portanto, não estávamos preparados. Aqui estão algumas dicas que todo jornalista deve saber quer espere ou não se encontrar no meio de um conflito.
1) Traga o equipamento certo
Em tempos de guerra, jornalistas precisam carregar mais que um gravador de voz e um bloco de anotações.
Cinthya Torrez, repórter do La Prensa, estava em Masaya, uma outra cidade fortemente atacada nos últimos meses. Ela recomenda que jornalistas usem coletes com identificação de imprensa, capacetes, lentes de proteção e sapatos confortáveis para todos os tipos de terreno. Se houver possibilidade de fogo cruzado, é importante considerar também um colete à prova de balas.
É um erro sair para uma reportagem sem estar devidamente preparado. Se a organização de mídia para a qual você trabalha não tem esse equipamento --como foi o caso em muitas redações na Nicarágua quando o conflito começou-- repórteres e fotógrafos devem se unir e solicitá-los como uma medida de emergência. Isso funcionou na Nicarágua e pode funcionar em outras redações.
2) Proteja-se
Jornalistas fazem um trabalho exemplar. Nós vamos a lugares que outros não podem e compartilhamos informações sobre o que está acontecendo. No entanto, não somos heróis e não vamos resolver conflitos.
Ivette Munguía, uma jornalista do La Prensa que presenciou várias trocas de fogo, recomenda proteger sua vida antes de garantir uma matéria. Não busque uma foto ou vídeo extraordinário sem ter certeza de que você o levará de volta à redação são e salvo.
"As balas não discriminam", diz Munguía. Embora um colete com identificação de prensa possa fazer com que facções armadas pensem duas vezes antes de disparar, não é uma peça de roupa que o torna invencível ou permita que você testemunhe tudo.
Em tempos de balas e assassinatos, é vital ser prudente para fazer bem nosso trabalho como jornalista.
3) Identifique as zonas de segurança
Nos confrontos é importante conhecer a geografia do terreno. Para isso, é melhor estabelecer contatos locais antes de chegar ao local de reportagem e solicitar informações de segurança antes de entrar nas áreas mais perigosas.
Os guias locais devem saber em todos os momentos as rotas de fuga ou esconderijos. No meu caso, quando eu estava em León, nosso guia nos forneceu uma casa segura através de seus conhecidos.
4) Prepare-se mentalmente
De acordo com Munguía, também é importante “evitar andar no meio das ruas ou usar roupas coloridas, de modo a evitar se tornar alvo de atiradores”.
Finalmente, quando você entra em zonas de conflito, deve se preparar mentalmente e estar pronto para tomar decisões pela sua segurança, tendo o trabalho saído como planejado ou quando problemas inesperados aparecem.
Munguía insiste em memorizar números de telefone caso você perca seu celular ou seja agredido. Isso é especialmente útil se perder contato com seus guias ou equipe e precisar pedir ajuda aos vizinhos.
Embora essas dicas se concentrem em zonas de conflito, você não deve ignorá-las mesmo se estiver em algum lugar seguro. Na Nicarágua, ninguém poderia imaginar a horrível realidade que enfrentamos nos últimos três meses. Como jornalista, é importante estar sempre preparado para mudanças repentinas nos ambientes sociais, políticos e culturais.
No nosso caso, a Nicarágua se tornou um campo de batalha inesperado e estamos nos adaptando a isso.
Fabrice Le Lous é bolsista do ICFJ e ex-editor do La Prensa na Nicarágua.
Imagem sob licença CC no Unsplash via Randy Colas