Jogo interativo da Al Jazeera ajuda leitor a investigar guerra digital na Síria

por Clothilde Goujard
Oct 30, 2018 em Jornalismo digital

"Espero que sua família esteja também."

Este é a frase segura que Ziad, um produtor da Síria, dá ao jogador no início do "#Hacked: Syria’s Electronic Armies", novo jogo interativo da Al Jazeera.

O jogo baseado no aplicativo de mensagens leva o jogador para o mundo complicado e perigoso da guerra digital da Síria. Ao longo do jogo, o jogador investiga o conflito subterrâneo enquanto troca informações com Juliana, a produtora encarregadao da reportagem.

Juliana Ruhfus é uma pessoa de verdade, assim como a maioria das pessoas no jogo. A jornalista da Al Jazeera produziu um documentário sobre a guerra digital da Síria em 2015. Tornou-se a base do jogo inovador que mais tarde criou com uma equipe de colaboradores.

#Hacked não é a primeira incursão de Ruhfus no jornalismo de games. Em 2014, ela desenvolveu "Pirate Fishing", uma investigação sobre a pesca ilegal na costa da Serra Leoa. O jogo ganhou Prêmio de Melhor Digital em 2015 da One World Media. Esta experiência ajudou-a a fazer #Hacked.

"O ponto de partida era criar algo onde a interação fosse um pouco mais significativo, porque, pessoalmente, senti que uma das coisas que poderíamos ter feito melhor com o "Pirate Fishing" era criar uma interação que poderia mudar o resultado", disse Ruhfus.

Em seu mais novo jogo, o jogador pode perder entrevistados, arriscar a vida deles, pegar vírus e, finalmente, deixar de apresentar a reportagem a tempo, dependendo das escolhas feitas.

"O ponto de partida para o projeto sírio foi dizer: 'O seu clique realmente importa'", disse Ruhfus.

Ruhfus não é bem uma gamer, e o projeto sírio não começou como um jogo. Com a equipe de produção acrescentando elementos interativos, de repente, perceberam que se parecia muito com um.

Embora Ruhfus tenha anos de experiência na realização de documentários, games de notícias estão fora de sua zona de conforto. Ela colaborou com John Lau, um estudante graduado na Escola Nacional de Cinema e Televisão, em Londres. Lau, que estuda design de games, forneceu um novo olhar e uma maneira diferente de pensar, ela disse.

"Eu acho que tinha visto os problemas e sabia o que estava me incomodando, mas eu realmente precisava de alguém que entendesse a natureza dos problemas e conversar sobre isso. John fez isso", Ruhfus explicou.

Ruhfus disse que colaboração é essencial para qualquer projeto de jornalismo inovador. Sua experiência de jornalismo foi um trunfo, mas ela também contou com colaboradores mais jovens que tinham diferentes visões e foram particularmente bons nos aspectos técnicos da produção. Sua equipe foi composta de profissionais como Nataly Rios Goico, consultora criativa na Conductrr e cocriadora do #Hacked; Ilze Juhnevica e Zahra Warsame, que trabalharam a tempo parcial no design do jogo; Lau, que forneceu suas habilidades de game-making; e o hacker ético Ali Haidar, que ofereceu a sua experiência em "info-sec".

Testes com usuários desempenharam um papel fundamental na produção do jogo. Apesar da necessidade, Ruhfus disse que era difícil de assistir, às vezes.

"Você vê o que está errado e isso é realmente muito doloroso e instrutivo, porque você percebe que tudo o que pensou que era claro não estava claro de modo algum", disse ela.

Mesmo antes de iniciar a produção, ela visitou estudantes de  jornalismo e design de game para ouvir as suas opiniões. Ela encontrou com eles novamente no meio de produção, quando sua equipe fez o roteiro do  #Hacked. Ela finalmente testou-o com os alunos que não estavam envolvidos no processo.

Um dos maiores desafios enfrentados por Ruhfus foi tornar o jogo divertido e bom jornalisticamente. Ruhfus queria que o jogo fosse factual e com base no trabalho real que ela fez para a sua própria investigação em 2015.

"Eu acho que a decisão mais difícil foi o número de elementos do jogo para colocar e quando dizer chega antes de se tornar ficcional demais", disse ela. "Quando faço um filme, faço uma experiência de usuário -- mas isso é uma convenção estabelecida. O problema com este formato é que tivemos de estabelecer as nossas próprias convenções e enfatizar que isso é real e que ainda é jornalismo."

Ruhfus e seus colaboradores discordaram às vezes. Por exemplo, ela recusou a sugestão de que Ziad, o produtor da Síria, poderia morrer por causa de uma violação de segurança. Ela queria que o jogador fosse capaz de apontar para um artigo de jornal ou reportagem e ver que o evento realmente aconteceu.

"Eu acho que você sempre anda uma linha fina como jornalista entre ter autoridade e o conhecimento que traz, e, ao mesmo tempo, ser incrivelmente aberto e aprender o tempo todo e dar outras pessoas uma voz", disse ela.

Encontrar novas maneiras de contar histórias para audiências mais jovens é uma preocupação comum entre os jornalistas; o game de notícias é apenas uma dessas maneiras. No futuro, Ruhfus disse que espera fazer experiências com realidade aumentada também.

Imagem principal de Juliana Ruhfus e secundária do time #Hacked cortesia da Al Jazeera