Jornalistas em zonas de perigo enfrentam uma escolha difícil: morte ou autocensura

por Jorge Luis Sierra
Oct 30, 2018 em Segurança Digital e Física

Enrique Juarez Torres, diretor editorial do El Mañana de Matamoros, um jornal com sede em uma cidade fronteiriça controlada pelo Cartel do Golfo, sabe muito bem o que significa uma "zona de silêncio". Um grupo de traficantes sequestrou Juarez no dia 4 de fevereiro de 2015.

"Vamos matar você", os sequestradores disseram a Juarez, por cobrir uma onda de violência que ocorre na cidade.

Juarez foi libertado no mesmo dia, mas ele encontrou a redação vazia. A maioria dos repórteres, editores e administrativos parou o trabalhos e deixou o jornal. Agora Juarez e sua família estão vivendo nos Estados Unidos onde ele está trabalhando remotamente.

A autocensura é comumente vista como uma maneira de jornalistas desistirem da liberdade de expressão, mas este problema pode ser visto sob uma luz diferente nas zonas perigosas da América Latina. Por causa de assassinatos, ameaças de morte e desaparecimentos, as organizações criminosas e funcionários corruptos estão criando zonas de silêncio, onde os jornalistas enfrentam um grande dilema: arriscar suas vidas cobrindo o crime e corrupção ou se censurando para continuar vivo.

Além de impor silêncio, os criminosos, por vezes, dão o passo extra de forçar jornalistas a publicar artigos em interesse dos criminosos. Os cartéis de drogas começaram a fazer os repórteres apresentarem certas fotos e matérias para suas redações desde 2004, quando Nuevo Laredo, uma cidade na fronteira EUA-México, tornou-se o campo de batalha da luta entre os cartéis de Sinaloa e Zetas. O editor do El Mañana de Nuevo Laredo, um grande jornal local, descobriu que um de seus repórteres estava sendo pressionado por uma organização criminosa para postar fotos de membros executados do grupo rival. Desde então, esta tendência de criminosos forçando o jornalista a publicar informação tornou-se uma prática comum no México.

Mas o silêncio nessas zonas não é absoluto. Há uma tensão permanente entre as forças para suprimir a liberdade de expressão e repórteres e editores corajosos aceitando o risco de continuar seu trabalho como jornalistas independentes.

Os jornalistas estão constantemente se adaptando para atender a essas condições desafiadoras. Em alguns casos, as organizações de mídia pararam de incluir bylines em matérias que envolvem violência relacionada às drogas. O anonimato do repórter pode fornecer uma segurança mínima. No entanto, pode ser uma medida fraca em cidades pequenas, onde é sabido quem cobre a editoria policial.

Em outros casos, redes de jornais cobrem notícias de tráfico de drogas em uma cidade e publicam as reportagens em outra cidade, muito longe do controle dos criminosos e funcionários corruptos incluídos nas matérias.

Algumas organizações de mídia tiveram casos em que repórteres e editores estão em conflito. O pior cenário é ter uma organização criminosa pressionando um repórter a fazer uma matéria, enquanto um grupo criminoso rival está forçando o editor a descartar a mesma matéria.

Análise orientada por dados

Precisamos usar tecnologia de mapeamento para analisar este problema para perceber o quão generalizada são as áreas de alto risco em nossas regiões e identificar tendências e padrões de agressão a jornalistas. A análise geográfica de 118 casos de assassinatos e desaparecimentos forçados de jornalistas no México entre 2005 e 2015 mostra áreas de alto risco em 71 municípios em 20 estados mexicanos.

No seguinte visualização usando dados de Periodistas en Riesgo, o mapa que criei como bolsista Knight em 2012, podemos ver a tendência crescente de áreas de alto risco para jornalistas no México ao longo dos últimos dois anos.

 

Nos últimos dois anos, o mapa Periodistas en Riesgo registrou 19 ataques com armas pesadas e explosivos contra jornais, emissoras de TV, estações de rádio e revistas impressas no México. A maioria dessas organizações continua trabalhando para informar o público, apesar da pressão violenta.

Em todos esses municípios e estados, o nível de violência relacionada ao tráfico de drogas e crime organizado é muito alto, mas a cobertura de incidentes relacionados com a droga é baixo. Uma investigação no estado fronteiriço de Nuevo Leon, realizada pela Fundação MEPI em 2013, mostra que apenas 9 por cento das 1.600 matérias de crimes foram sobre tráfico de drogas. Apenas 55 por cento dos jornalistas incluiu sua assinatura.

Redução de risco

Aqui estão alguns conselhos para jornalistas que trabalham em áreas de alto risco, enfrentando forças que tentam impor silêncio e suprimir a liberdade de expressão:

1. Repórteres e editores precisam trabalhar juntos. Editores precisam entender o contexto e o ambiente em rápido movimento, e os repórteres devem seguir protocolos de segurança.

2. Os jornalistas têm de criar redes de confiança para ficar a par de incidentes de segurança e ajudar qualquer repórter em problemas nessas áreas. A comunicação entre eles devem ser criptografada. Você pode encontrar algumas ferramentas de criptografia aqui.

3. Use aplicativos de segurança. Veja esta lista:

  • Reporta vai permitir que o usuário faça um check-in quando trabalhar em ambientes perigosos e enviar um alerta SOS em risco iminente.
  • Hancel é um aplicativo de telefone celular para Android que permite que jornalistas reportem agressões quando acontecem e programem alertas automáticos em caso de um incidente. Jornalistas podem selecionar quais contatos pessoais e organizações de liberdade de expressão vão receber os seus alertas e criar uma rede que permite uma resposta mais imediata e coordenada.
  • Panic Button permite ao usuário enviar um SMS de emergência para três contatos confiáveis em uma emergência. Ele anexa um link a um mapa com as coordenadas do local quando o GPS é ativado. Também protege dados de aplicativos com tela de disfarce e número PIN, e fornece dicas sobre segurança para uma utilização mais segura.

4. Quando possível, crie uma unidade especial para cobrir a corrupção e o crime organizado e analisar a origem e motivação de qualquer história relacionada antes de publicar.

5. Criptografe, criptografe, criptografe. É muito importante aprender a criptografar dados e arquivos de suas investigações, comunicações e arquivos. Você pode ver alguns tutoriais aqui.

Imagem principal sob licença CC no Flickr via Knight Foundation